24.1.11

Balanço da noite de ontem

VENCEDORES

1. Aníbal Cavaco Silva. Independentemente de ter sido a mais escassa e menos concorrida, a vitória de ontem fecha a mais longa e mais bem sucedida carreira política em democracia. Apenas Jorge Sampaio o derrotou em confronto directo e daqui a duas semanas a escassez da sua vitória terá passado para o domínio das curiosidades estatísticas da história, em nada o fragilizando no exercício dos poderes presidenciais. Juntou-se à lista dos políticos zangados com o establishment mediático, mas tem a frieza suficiente para, aliviado da compressão da campanha, mudar de discurso, aposto.

2.  Fernando Nobre. Tem um discurso pobre e não parecia capaz de capitalizar a janela de oportunidade que Mário Soares lhe abriu. Apesar do seu mau desempenho em campanha, conquistou uma fatia significativa do eleitorado anti-sistema e tem que reflectir sobre o que fará com esta vitória. Acredito que, para usar a sua metáfora infeliz, acabará por dar ele próprio o tiro na cabeça que o retirará do primeiro plano, mas passou a existir como voz com legitimidade na política naiconal.

3. José Manuel Coelho e o populismo desbragado. Este  foi o maior resultado alguma vez atingido por um tipo de populismo que tem existido em estado latente e que faz de Alberto João Jardim um político institucional. A sua transversalidade e sucesso criou uma incógnita no sistema político. O homem que apenas tinha conseguido eleger-se a si mesmo para o parlamento regional transformou-se numa figura política nacional, foi tratado como alternativa pelo eleitorado madeirense, até ganhou o Funchal e pode aspirar a polarizar nacionalmente o populismo, criando novidade eleitoral e "colorindo" um próximo parlamento. Décadas depois, o jardinismo pode ter gerado um antídotoigualmente venenoso, com o risco adicional de ter o potencial para transbordar a região que a vinculação do jardinismo ao PSD nunca permitiu.

PASSARAM AO LADO

1. Pedro Passos Coelho e o PSD. Reduzido a Presidente da Assembleia Municipal de Vila Real o líder do PSD sabe que não terá um aliado em Belém. Pelo contrário, sofrerá com Cavaco o que vários líderes do PS sofreram com Soares - e até com Sampaio. Ontem, fez o discurso mais inteligente da noite, afastando as legislativas antecipadas, como se não as desejasse ardentemente. Mas o tempo pode correr contra ele e não deixará de atacar na primeira oportunidade - um orçamento rectificativo ou o FMI - obrigando a esquerda a salvar Sócrates ou precipitando uma crise.

2. Francisco Lopes. O resultado não o retira da corrida à sucessão formal de Jerónimo, que muita gente acredita que já sucedeu na prática. Mas também não o lançou com a mesma força com que no passado tinha acontecido a Carvalhas e ao próprio Jerónimo. Tem que continuar a treinar a empatia com o eleitorado comunista e que fazer muito melhor para saír do núcleo duro, mas mostrou ser bom em debate.

3. Os eleitores que votaram significativamente em branco. Quiseram dar um sinal de descontentamento, mas não se falou deles e o seu voto não faz parte, pelas regras. da contagem. José Saramago, com a sua metáfora, lançou um movimento que tem já mais peso que visibilidade.

DERROTADOS

1. Manuel Alegre, o PS e  BE. A extensão da derrota faz com que o discurso de grande dignidade de ALegre, atraindo sobre si o mau resultado não reflicta toda a realidade. Alegre não capitalizou o seu resultado pessoal de há 5 anos. O PS não conseguiu atrair o seu eleitorado para o seu candidato, apesar dos apelos dos seus dirigentes. A aditividade de eleitorados entre PS e BE revelou-se inexistente. A maionese da candidatura de Alegre deslaçou e todos os seus ingredientes saem tprejudicados. Ao contrário de outras alianças à esquerda bem mais dificeis no passado, esta revelou-se ruinosa.

2. A eleição directa do PR. Quando a eleição do vértice superior do nosso sistema político tem uma participação ao nível de uma eleição autárquica, sai derrotado o desenho institucional que tem nas Presidenciais um momento simbólico de grande importância nacional. Se fosse um referendo, não era vinculativo e, por este caminho, qualquer dia atingimos abstenções ao nível do Parlamento Europeu. Todos os que defendem a eleição directa do PR precisam de reflectir sobre o que fazer para que a erosão prolongada deste acto eleitoral não resulte num movimento para a sua supressão. Seria desastroso num país em que o Parlamento tem má imagem e é pouco respeitado.

3. Defensor de Moura. Julgou que atrairia os socialistas descontentes com a estratégia do PS. Enganou-se redondamente. Foi um dos agentes que mais contribuiram para que a campanha fosse feia e baixa. Talvez tenha sido o maior credibilizador de José Manuel Coelho.

4. O Cartão do Cidadão. Independentemente da sua falha ter sido ampliada pelo vazio noticioso entre o fecho das urnas e as primeiras sondagens, é inaceitável que ninguém tenha previsto ou conseguido gerir uma situação em que muitas mesas de voto não teriam acesso à internet e previsivelmente muitos eleitores não teriam procurado com antecedência o seu novo lugar de voto. O Portugal tecnológico não pode esquecer-se de que o país real é o país real.

2 comentários:

Carta a Garcia disse...

Caro Paulo,

Fiz link para "A Carta a Garcia".
Obrigado.
OC

joshua disse...

Inteiramente de acordo.

Abraço.