29.8.10

Parabéns pela coragem de falar por si, Ermelinda.

"Em Almada, a subserviência do Bloco de Esquerda à CDU revolta-me e indigna-me. Por uma questão de honra e dignidade pessoal, não posso pactuar com este defraudar das expectativas que criámos nos nossos eleitores". 
Esta frase vem na carta dirigida aos eleitores por Ermelinda Toscano, que foi eleita pelo BE para a Assembleia Municipal de Almada e para a Assembleia de Freguesia de Cacilhas e reflecte o estado de espírito de quem acreditava que votar no BE era votar contra o domínio asfixiante da CDU sobre o concelho.
A divisão entre os que queriam a afirmação de independência e autonomia do BE e os que o usam para prolongar e dar conforto ao marasmo do poder da CDU já era evidente há bastante tempo. Eu próprio já tinha perguntado quantos Blocos de Esquerda há em Almada e tinha denunciado que o Bloco devolveu à CDU através da sua vereadora o que os eleitores lhe tiraram, a maioria absoluta.
Também se percebia que havia eleitos do BE embaraçados com o servilismo ao PCP de alguns dos seus camaradas. Mas não se sabia o desfecho. Agora soube-se. Vamos ter mais três anos de BE atento e venerando à grande irmã CDU.
Mas não se perde tudo. Acredito que as vozes independentes da CDU hão-de fazer ouvir-se nos seus partidos, incluindo dentro do BE. Os que acreditam na construção de uma plataforma de mudança no concelho, vindos de vários partidos, sabem também que Ermelinda Toscano, liberta do espartilho da facção filoCDU do BE local, vai ser uma voz ainda mais importante do que ja é na denúncia dos desmandos do círculo do poder de Maria Emília de Sousa. Os textos mais recentes no blogue Infinitos são indicadores inequívocos de que assim será.  Parabéns pela coragem de falar por si, Ermelinda.

(Publicado também no blogue Por Almada)

19.8.10

Pour Sarko, James Bond Theme by Fanfare Ciocarlia (Romania)

JAMES BOND THEME by Fanfare Ciocarlia

São apenas ciganos romenos

Primeiro foi a Itália, agora a França, o "racismo de Estado" - como lhe chama alguém não identificado na notícia - recrudesce na Europa.


Bem sei que é fácil não ter simpatia por ilegais instalados em acampamentos e que há muito lip service nos protestos internacionais. Assim como é seguro que haverá muitos eleitores que aprovam sem reservas este tipo de medidas.

Mas o Estado escolher para deportação em função de um grupo étnico ou de um tipo de alojamento provisório é um indicador de que uma doença séria já tomou conta das nossas democracias. Que o faça sob aplauso popular diz-nos que os sintomas de tal doença tendem a agravar-se.

Para muitos de nós são apenas ciganos romenos, presumíveis criminosos, embora não tenham sido acusados de nenhum crime em concreto. Et voilá.

6.8.10

Partnerships are based on trust



Fonte: Time, cartoons of the week

Uma sociedade de transparência e rigor para ambos os extremos da pirâmide social?

Não conheço os fundamentos nem o sentido da opinião que o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados tem sobre as novas regras em relação aos benefícios sociais e que o Diário Económico hoje noticia, portanto nada posso dizer sobre o mérito da sua posição.
Não me surpreenderia que estivesse em causa o aspecto que muitos consideram menor de um pobre que se candidata a um apoio social ter que fornecer à segurança social informação que um rico que tente evitar pagar impostos não é obrigado a fornecer ao fisco. E até tendo a achar que ambos devem ser obrigados a fornecê-la e que isso é que é justo.
Mas posso dizer que gostava de ter a certeza que as regras de transparência e moralização que se quer impôr aos muitos pobres serão aplicadas com rigor equiparável aos muitos ricos que tenham a veleidade de fugir ao fisco. Assim teriamos uma sociedade da exigência e do rigor, que não deixaria escapar quem deve contribuir nem deixaria abusar quem deve ser apoiado. Caso contrário, estaremos perante uma terrível dualidade de critérios, em que é aceite que os bafejados pelo sucesso não assumam as suas responsabilidades perante a colectividade enquanto se vigia atenta e severamente os que já foram prejudicados pela roda-da-fortuna (chamemos-lhe assim) do capitalismo. Como se no equilíbrio das contas públicas apenas contasse o que cortamos na coluna dos pagamentos e não o que falta na coluna dos recebimentos.

5.8.10

Uma maneira de ver a nova condição de recursos nas prestações sociais #2

Um aspecto que tem sido pouco visivel na nova lei da condição de recursos é a adopção de uma fórmula mais restritiva (agora uniforme) de capitação dos rendimentos para efeitos de acesso a prestações sociais.
No texto anterior sobre esta questão usei, para uma demonstração sintética, o valor de 100% do Indexante de Apoios Sociais (IAS), demonstrando que o efeito da nova fórmula para a capitação sobre o rendimento máximo de uma família de 2 adultos e 2 crianças para que possa aceder a benefícios sociais implica um retrocesso de vários anos, mesmo descontando a inflação entretanto ocorrida.
Chamam-me a atenção para que esta demonstração genérica pode induzir em erro, porque até ao momento cada prestação social tinha regras específicas, quer quanto à percentagem do IAS considerada, quer quanto ao modo de cálculo da prestação. Importa, pois, voltar ao tema, agora olhando para as principais prestações abrangidas.
Reapresento, pois, o meu argumento, exemplificando agora com os casos contretos do Rendimento Social de Inserção (RSI), dos Subsídios de Parentalidade no âmbito da Solidariedade Social (SSP) e do Subsídio Social de Desemprego (SSD).
O RSI é atribuído com base em 40% do IAS e para uma família de 2 adultos e 2 crianças o valor máximo de rendimento de uma família para ser elegível era de 1,2 IAS (0,4 por adulto e metade desse valor por criança) até 31 de Julho. O SSP e o SSD é atribuído com base em 80% do IAS e, para a mesma estrutura familiar, o valor máximo do rendimento de uma família elegível era de 3,2 IAS (0,8 per capita, independentemente de ser-se adulto ou não).
A partir de 1 de Agosto, no caso do RSI desce de 1,2  para 1,08 IAS. No caso do SSP e do SSD desce de 3,2 para 2,7 IAS por força da nova fórmula unificada de capitação que valoriza dentro de uma família o segundo adulto em 70% (e as crianças em metade) do primeiro adulto.
Esta harmonização foi feita sem revalorizar o IAS nem qualquer outra medida compensatória eo seu resultado prático é baixar o valor máximo de rendimento de uma família para que seja elegível para os apoios sociais mínimos do Estado aos cidadãos, à parentalidade e aos desempregados.
Mais, esta alteração é acompanhada de outras medidas como a decisão administrativa de "fixar" os adultos co-residentes ao agregado familiar, cujo impacto não consigo estimar, mas pode ser destrutivo para alguns percursos de autonomização de jovens pobres e para algumas dinâmicas familiares e cria uma taxa real de imposto sobre os rendimentos dos jovens adultos de famílias pobres elevadissima que pode desencorajar fortemente a procura de trabalho e ampliar a armadilha da dependência de apoios sociais.
Que efeito tem a "tesourada" nas capitações sobre estas prestações sociais?
O quadro demonstra que o limiar de pobreza para acesso de uma família com 2 adultos e 2 crianças a prestações sociais de solidariedade desce abaixo do valor que tinha em 2006. No caso do desemprego e da parentalidade, a redução é ainda mais drástica e o limiar de acesso descerá agora para 75,5% do que era em 2005.
Esta redução do limiar de protecção nestas situações para um valor nominal actual anterior ao valor de 2006 terá também consequências imediatas na redução do número de beneficiários que podem ainda não estar disponíveis mas serão apuradas rapidamente, na medida em que as prestações a cortar ou a reduzir por força desta dimensão da nova condição de recursos já foram cortadas ou recalculadas com efeitos a partir de 1 de Agosto e as famílias estão agora, certamente, a ser notificadas do facto.  Por essa via, terá um impacto financeiro na redução da despesa, autónomo do que resultará das noticiadas medidas de moralização, porque será imediato, enquanto o outro ainda dependerá de acções a tomar psoteriormente.
Finalmente e acima de tudo terá um efeito de aumento da pobreza em quantidade, intensidade e severidade que os estudos só demonstrarão daqui a uns anos, mas que pode ser simulado retrospectivamente e me dizem que já foi simulado num trabalho académico ainda não disponível.

Este Verão, o ping-pong de Londres é mais agradável..

A mesma organização que espalhou pianos pela cidade, teve agora esta ideia fantástica e espalhou mesas de ping-pong por todo o lado, chama-se Ping! Festival e o barulhinho das bolas de ping-pong aqui e ali é mesmo engraçado e dá à cidade um ar sempre em festa, escreve  Paula Tomé e imagina-se com facilidade como deve ser agradável. Para animação, é incomensuravelmente mais divertido e mais saudável do que o ping-pong lisboeta deste Verão.

"Mas quantos é que eram?". Que importa?

O problema verdadeiramente sério da investigação criminal não é a guerra entre o SMMP e o PGR

A guerra de palavras entre o SMMP e o PGR de que o comunicado de ontem é um lamentável episódio pode tentar disfarçar o óbvio, mas não consegue. De facto, a direcção do sindicato julga-se o soviete do ministério público e entendeu que chegou o momento de tentar o seu golpe de Agosto. Mas a guerra de palavras entre PGR e SMMP a propósito do despacho com a discursividade do combate político que fechou o processo FREEPORT é o menor dos problemas que estão em cima da mesa.
O problema verdadeiramente sério é o de que quando a incompetência, a tentação política e a pulsão mediática se juntam e toldam o distanciamento crítico que o estatuto de magistrado impõe, não é o magistrado A ou B ou o ministério público como corpo que sai prejudicado, é a justiça e, por essa via, a democracia. Quem pensa que estamos perante um epifenómeno de Verão ou apenas perante um incidente sobre o teor infeliz de um despacho de um magistrado não percebe o que se está a passar. Aquilo a que estamos a assistir é a mais uma erupção de um vulcão que é um problema estrutural da nossa democracia, vulcão esse cuja existência deve fazer todos os cidadãos sentirem-se inseguros e encorajar as instituições a actuar, não apenas irritar os visados em cada afloramento do problema.
É certo que os problemas do mau funcionamento da investigação criminal em Portugal só se discutem a sério de cada vez que os visados, para além de estarem inocentes, têm visibilidade mediática, mas a quantos cidadãos anónimos tais pulsões, quando vencem o profissionalismo dos magistrados, destruirão as vidas sem que ninguém dê por isso, mesmo quando a justiça acaba em última instância por se fazer, como em regra acontece?

3.8.10

Pinto Monteiro com a coragem e frontalidade que não tem sobejado na hierarquia do MP

Se tomar consciência de um problema for o primeiro passo para o resolver, a entrevista de hoje do PGR ao DN será uma pedrada no charco. Se assim não for, o rei continuará nú como vai há muito e ficaremos à espera das próximas vítimas, com a indiferença com que temos vivido quanto ao que significa para a democracia o risco de captura de orgãos fundamentais do sistema de justiça por interesses particulares.
Agora que houve quem decidisse fazer abertamente política com despachos judiciais as coisas entram mais que nunca pelos olhos dentro. Se o sistema político -  governo e todas as oposições incluídas -  decidir mantê-los fechados, que ninguém se queixe quando voltar a acontecer. Por hoje leia-se Pinto Monteiro com a coragem e frontalidade que não tem sobejado no tratamento destes assuntos:

É absolutamente necessário que o poder político (seja qual for o governo e sejam quais forem as oposições) decida se pretende um Ministério Público autónomo, mas com uma hierarquia a funcionar, ou se prefere o actual simulacro de hierarquia em que o procurador-geral da República, como já vem sido dito, tem os poderes da Rainha de Inglaterra e os procuradores-gerais distritais são atacados sempre que pretendem impor a hierarquia.
É imperioso que se diga que modelo se deseja para o País:
Se um sistema em que o Sindicato quer substituir as instituições ou um Ministério Público responsável. É preciso que sem hesitações se reconheça que o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público é um mero lobby de interesses pessoais que pretende actuar como um pequeno partido político.
É essa a questão que o poder político deve esclarecer de forma inequívoca, não sendo lícito defender uma posição enquanto poder e outra enquanto oposição.  

Por razões diferentes, fico curioso, muito curioso, quanto às reacções que PSD e PCP terão a esta entrevista.

2.8.10

Uma maneira de ver a nova condição de recursos nas prestações sociais

Uma maneira de ver a nova condição de recursos nas prestações sociais é a seguinte: todas as famílias de dois adultos e dois menores que têm um rendimento mensal entre 1131,894 euros e 1257,66 euros tinham até 31 de Julho direito ao subsídio social de desemprego, ao RSI e a prestações sociais de parentalidade e perderam-no a 1 de Agosto (ver gráfico). Com isto, o limiar de acesso das famílias carenciadas a estas prestações caíu para um nível inferior a 2006 (mesmo em termos nominais e sem contarmos com a inflação desde esse ano). Não sei quantas famílias perdem os apoios por ter baixado o limite de rendimentos para lhes aceder mas, como as prestações já estão a ser cortadas, quem o pergunte ao Instituto de Segurança Social não terá difícudade para saber. E isto nada tem que ver com combate à fraude ou aperfeiçoamento na verificação de rendimentos que o spin eficaz fez tomar conta das notícias sobre o assunto. É apenas a parte da tesourada na despesa com estas famílias, que o governo entendeu dar ao introduzir uma fórmula de cálculo mais restritiva sem actualizar o Indexante de Apoios Sociais. São escolhas.