8.5.13

O enternecedor gosto pelo risco dos prestamistas modernos e o sucesso da nossa colocação de dívida pública

Emprestar dinheiro aos Estados costumava ser uma tarefa de alto risco. Conferia influência, podia ser um seguro de vida para uma minoria perseguida, mas também ligava o prestamista aos destinos do soberano. Agora, como evidência do gosto pelo risco dos empresários modernos, emprestar dinheiro aos Estados pode ser, como está agora a ser com Portugal, uma actividade em que um banco pede ao Estado (o BCE) para emprestar ao Estado (Portugal), paga o que pede a 0,5% e consegue cobrar 5,6% de juros.
E consegue esta margem emprestando dinheiro europeu a um país europeu, a um país que não está nem estará em guerra, está inserido numa zona monetária poderosa, sob governação condicionada à garantia do cumprimento dos compromissos externos e sob grande pressão internacional para honrar as suas dívidas até ao último cêntimo. O gosto das empresas modernas pelo risco é enternecedor.
 Responder-me-ão que há em Portugal risco de default e é esse que é medido pela taxa de juro que pagamos. É verdade. Mas esse risco não é independente da política do "nosso" Banco Central ser indiferente à saúde da nossa economia e da nossa capacidade de gerar emprego. A administração do condomínio monetário em que temos uma pequena fracção não quer saber das brechas na parte comum do edifício que nos pertence. E essa indiferença pode custar-nos, por exemplo, 1500 milhões de euros em 10 anos, só num empréstimo de 3000 milhões.
Em cada empréstimo com um diferencial de 5% entre os custos que nos cobram e os custos que o "nosso" banco central cobra a quem nos empresta, os erros de gestão do nosso condomínio monetário estão a ser pagos por nós. Quando a crise acabar e se alguém se der ao trabalho de comparar o diferencial de taxas entre o que o BCE praticou a quem nos emprestou e o que quem nos emprestou praticou em relação a nós, poderemos fazer o balanço de quanto a administração da União Europeia tirou dos bolsos das famílias portuguesas para entregar aos agiotas apátridas que presidem a bancos de não importa que nacionalidade.
Mas isto só muda mudando a União Europeia e criando um mecanismo que faça quem a governa ser responsável perante todos os Europeus e não apenas por uma fracção deles, fracção essa que pode até pensar que a sua fracção do condomínio  - já de si a mais espaçosa e confortável - não meterá água, nem sequer quando o prédio ameaçar ruína.
Já ouço à minha direita o aviso de que o BCE não tem mandato para o que pressuponho. Pois não. Uma das características da política é adaptar os mandatos das instituições sob responsabilidade pública à resposta às necessidades relevantes da sociedade. E se a Europa não está numa situação em que as instituições não estão a responder às necessidades sociais, então está em que situação?

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