5.8.10

Uma maneira de ver a nova condição de recursos nas prestações sociais #2

Um aspecto que tem sido pouco visivel na nova lei da condição de recursos é a adopção de uma fórmula mais restritiva (agora uniforme) de capitação dos rendimentos para efeitos de acesso a prestações sociais.
No texto anterior sobre esta questão usei, para uma demonstração sintética, o valor de 100% do Indexante de Apoios Sociais (IAS), demonstrando que o efeito da nova fórmula para a capitação sobre o rendimento máximo de uma família de 2 adultos e 2 crianças para que possa aceder a benefícios sociais implica um retrocesso de vários anos, mesmo descontando a inflação entretanto ocorrida.
Chamam-me a atenção para que esta demonstração genérica pode induzir em erro, porque até ao momento cada prestação social tinha regras específicas, quer quanto à percentagem do IAS considerada, quer quanto ao modo de cálculo da prestação. Importa, pois, voltar ao tema, agora olhando para as principais prestações abrangidas.
Reapresento, pois, o meu argumento, exemplificando agora com os casos contretos do Rendimento Social de Inserção (RSI), dos Subsídios de Parentalidade no âmbito da Solidariedade Social (SSP) e do Subsídio Social de Desemprego (SSD).
O RSI é atribuído com base em 40% do IAS e para uma família de 2 adultos e 2 crianças o valor máximo de rendimento de uma família para ser elegível era de 1,2 IAS (0,4 por adulto e metade desse valor por criança) até 31 de Julho. O SSP e o SSD é atribuído com base em 80% do IAS e, para a mesma estrutura familiar, o valor máximo do rendimento de uma família elegível era de 3,2 IAS (0,8 per capita, independentemente de ser-se adulto ou não).
A partir de 1 de Agosto, no caso do RSI desce de 1,2  para 1,08 IAS. No caso do SSP e do SSD desce de 3,2 para 2,7 IAS por força da nova fórmula unificada de capitação que valoriza dentro de uma família o segundo adulto em 70% (e as crianças em metade) do primeiro adulto.
Esta harmonização foi feita sem revalorizar o IAS nem qualquer outra medida compensatória eo seu resultado prático é baixar o valor máximo de rendimento de uma família para que seja elegível para os apoios sociais mínimos do Estado aos cidadãos, à parentalidade e aos desempregados.
Mais, esta alteração é acompanhada de outras medidas como a decisão administrativa de "fixar" os adultos co-residentes ao agregado familiar, cujo impacto não consigo estimar, mas pode ser destrutivo para alguns percursos de autonomização de jovens pobres e para algumas dinâmicas familiares e cria uma taxa real de imposto sobre os rendimentos dos jovens adultos de famílias pobres elevadissima que pode desencorajar fortemente a procura de trabalho e ampliar a armadilha da dependência de apoios sociais.
Que efeito tem a "tesourada" nas capitações sobre estas prestações sociais?
O quadro demonstra que o limiar de pobreza para acesso de uma família com 2 adultos e 2 crianças a prestações sociais de solidariedade desce abaixo do valor que tinha em 2006. No caso do desemprego e da parentalidade, a redução é ainda mais drástica e o limiar de acesso descerá agora para 75,5% do que era em 2005.
Esta redução do limiar de protecção nestas situações para um valor nominal actual anterior ao valor de 2006 terá também consequências imediatas na redução do número de beneficiários que podem ainda não estar disponíveis mas serão apuradas rapidamente, na medida em que as prestações a cortar ou a reduzir por força desta dimensão da nova condição de recursos já foram cortadas ou recalculadas com efeitos a partir de 1 de Agosto e as famílias estão agora, certamente, a ser notificadas do facto.  Por essa via, terá um impacto financeiro na redução da despesa, autónomo do que resultará das noticiadas medidas de moralização, porque será imediato, enquanto o outro ainda dependerá de acções a tomar psoteriormente.
Finalmente e acima de tudo terá um efeito de aumento da pobreza em quantidade, intensidade e severidade que os estudos só demonstrarão daqui a uns anos, mas que pode ser simulado retrospectivamente e me dizem que já foi simulado num trabalho académico ainda não disponível.

1 comentário:

Anónimo disse...

Um outro olhar
http://claudio-carvalho.com/da-essencia-dos-ataques-ao-estado-social/