30.9.08

O novo farol do comunismo

O PCP tem vindo a dar sinais cada vez menos subtis de que se vê como uma das maiores esperanças mundiais do renascimento do comunismo. Para isso necessitaria, evidentemente, de se reposicionar e mudar a sua estratégia clássica na política interna. Talvez o Congresso que aí vem seja o momento em que esse movimento se vai tornar visível. Mas, precisa também de encontrar uma explicação "materialista histórica" para o fim da experiência soviética. Segundo a última edição do Avante encontrou, em dois camaradas americanos que entrevista e que, seguramente em consonância com o método do materialsmo histórico, concluiram que a queda tem a ver com a traição social-democrata de Gorbachov, a qual não encontrou adversário socialista à altura do que tinha acontecido no passado, com Estaline. O novo internacionalismo do PCP, na senda dos camaradas americanos entrevistados, é um neoestalinismo, como melhor se verá pela análise das Teses ao Congresso. A entrevista é absolutamente clarificadora, com o Avante a colocar-se no papel do cidadão com dúvidas e os "materialistas históricos" a darem as respostas clarificadoras. Vale a pena ler na íntegra, mas para abrir o apetite, ficam dois extractos (títulos meus): 1. Sobre a democracia na URSS Todavia, alguns apontam como causas do colapso a degeneração do partido comunista, o facto de o trabalho colectivo ter sido substituído a dada altura por um pequeno círculo de dirigentes e mesmo por um só dirigente individualmente; a democracia partidária ter sido estrangulada por um sistema burocrático centralizado; a indesejável fusão e confusão entre as estruturas do partido e do Estado; o afastamento do partido das massas; o fracasso da democracia socialista que era apresentada como um tipo superior de democracia. De acordo com esta tese, o povo soviético foi despojado do poder político e isso foi fatal para o socialismo. Concordam? TK - A visão de que a União Soviética sofria de um défice democrático e de um excesso de centralização está muito espalhada entre socialistas reformistas, sociais-democratas, historiadores burgueses e mesmo entre alguns comunistas, mas, na nossa opinião, é uma visão errada e exagerada dos problemas da democracia soviética. Apesar de alguns problemas, a democracia soviética tinha uma grande vitalidade. Cerca de 35 milhões de trabalhadores participavam directamente no trabalho dos sovietes, que eram instituições de poder que tomavam decisões efectivas, 163 milhões de trabalhadores estavam sindicalizados, o partido tinha 18 milhões de militantes, a democracia tinha outras instituições como as secções de cartas do leitor em todos os jornais, as organizações de mulheres e de jovens. É verdade que todas estas instituições tinham insuficiências, poderiam funcionar melhor e de forma mais efectiva, mas não é verdade que fossem instituições de fachada. As pessoas que atacaram o nosso livro acreditam, na sua maioria, que a falta de democracia e o excesso de centralização foram as causas do colapso soviético. Curiosamente, este sempre foi o principal argumento da burguesia para difamar o regime soviético muito antes da chegada de Gorbatchov. Na nossa opinião é incorrecto acusar a democracia soviética de ter levado ao colapso. RK – Muitas dessas críticas radicam na concepção burguesa de democracia. Na verdade a União Soviética sempre foi acusada de não ter uma democracia burguesa, de não ter partidos concorrentes. Todavia, as formas de democracia socialista, sem serem perfeitas, eram sob muitos aspectos muito mais ricas do que a democracia burguesa. Penso que o recente conflito na Geórgia nos fornece um exemplo a este respeito. Na antiga União Soviética, a Ossétia do Sul era um território autónomo onde as minorias étnicas tinham as suas escolas, língua, cultura. Após a desagregação da URSS, a «democracia» georgiana aboliu o estatuto de autonomia dos ossetas, o que agravou as tensões e desembocou numa guerra na região. TK – Houve razões históricas que determinaram que na URSS apenas houvesse um partido. Logo a seguir à revolução os restantes partidos combateram o poder soviético, os socialistas revolucionários abandonaram o governo e tudo isso levou a que apenas ficassem os bolcheviques. A maioria dos países socialistas europeus tinha vários partidos, embora o papel dirigente do partido da classe operária fosse salvaguardado. A existência de um só partido acentuou a ideia de fusão entre o partido e o Estado, mas não vemos que isso possa ter constituído uma causa do colapso. 2. Para a URSS sobreviver, faltou outro Estaline Para alguns a perestróika tinha boas intenções mas falhou. No vosso livro, afirmam que esta foi a grande oportunidade para as forças anti-socialistas avançarem. Qual foi a responsabilidade e que intenções reais teve Gorbatchov em todo este processo? TK – Apesar das suas posições oportunistas, não pensamos que Gorbatchov tenha agido conscientemente logo de início para trair o socialismo e restaurar o capitalismo. Ao contrário de Andrópov, que era profundo e um marxista-leninista genuíno, Gorbatchov era um brilhante actor, mas uma pessoa superficial, sem grande preparação teórica. Quando se deslocou politicamente para a direita sob a influência de Iákovlev*, descobriu que o imperialismo o aprovava, que os elementos corrompidos do partido concordavam com ele, especialmente aqueles ligados à segunda economia que defendiam o sector privado, e aos poucos foi acelerando as reformas neste sentido. A dado momento Gorbatchov tomou a decisão consciente de que não era mais um comunista, mas um social-democrata, não acreditava mais na planificação, na propriedade social dos meios de produção, no papel da classe operária, na democracia socialista, queria que a União Soviética se transformasse numa Suécia ou algo parecido. O oportunismo, o abandono da luta foi um processo gradual que se tornou evidente em 1986. Alguns dirigentes do partido ofereceram determinada resistência, como foi o caso de Ligatchov*, mas mesmo este tinha fraquezas, embora fosse de longe melhor homem do que Gorbatchov. Ligachov foi apanhado de surpresa. Ele próprio afirmou que havia duas formas de corrupção, uma que há muito todos sabiam que existia, e à qual queriam pôr fim quando assumiram o poder em 1985; e uma outra que surgiu no espaço de um ano e meio como uma forte vaga de pressão, vinda da «segunda economia» e das organizações mafiosas florescentes. Como puderam esses sectores emergir com tal força na sociedade socialista? TK – A «segunda economia» alcançou uma expressão importante em dois períodos da história da URSS: o primeiro foi durante a Nova Política Económica (NEP) dos anos 20 que permitiu o desenvolvimento do capitalismo, sob controlo estatal dentro de determinados limites. Esta foi uma opção consciente do Estado socialista tomada provisoriamente para fazer face à situação de emergência causada pela guerra civil. Em 1928-29 a NEP foi superada de forma decidida. No entanto, dirigentes do partido como Bukhárine defenderam a manutenção da NEP apresentando-a como a via mais adequada para alcançar o socialismo. Esta corrente foi derrotada pela maioria do partido liderada por Stáline, que justamente lembrou que a NEP fora definida por Lénine como um recuo necessário, porém temporário. E apostaram na planificação centralizada e na propriedade social dos meios de produção. Mas este período dos anos 20 ficou marcado não só pelo florescimento do capitalismo e dos sectores marginais e criminosos, mas também pelo alastramento de uma ideologia de direita, anti-socialista. Ou seja, podemos ver claramente uma correspondência entre a base material e a ideologia. O segundo período foi mais prolongado e gradual. Teve início em meados dos anos 50, após a morte de Stáline. Khruchov foi a primeira peça deste puzzle. Em muitos aspectos, não todos, teve desvios de direita e quando estes foram demasiados houve uma correcção. Veio Bréjnev, mas este detestava mudanças, queria estabilidade, e apesar das disputas entre as alas esquerda e direita os problemas continuaram a acumular-se.

29.9.08

Levanta-te e actua contra a pobreza

Esta iniciativa de luta contra a pobreza já está em marcha, como se pode consultar aqui. Para que se saiba em que consiste, reproduzo o texto de apresentação: "Dia 17 de Outubro é o Dia Mundial para a erradicação da pobreza e, à semelhança do ano passado, espera-se que volte a ser um grande momento de mobilização a nível nacional e internacional. Em 2007, mais de 43 milhões de pessoas levantaram-se para exigir aos líderes mundiais que cumpram as suas promessas para acabar com a pobreza e desigualdade. Portugal contribuiu com mais de 65 mil vozes nesta iniciativa. Este ano precisamos da tua ajuda para bater um novo recorde e a enviar uma mensagem ainda mais forte para os nossos governantes. Estamos a meio caminho de 2015, ano que marcará o final do período para alcançar os Objectivos do Milénio. É urgente “Levantarmo-nos e Actuarmos”, para que os governos honrem os seus compromissos. Tal só acontecerá se tomarmos uma posição clara. Esta data representa uma excelente oportunidade para mobilizar a sociedade civil a actuar contra a dura realidade da pobreza extrema. A cada dia que passa, 50 mil pessoas morrem de pobreza extrema e a desigualdade entre os ricos e pobres não pára de aumentar. Aproximadamente metade da população mundial vive em situação de pobreza! Lançamos o convite para que em Portugal todos e todas, individualmente ou em grupo, se levantem, literal e simbolicamente, entre os dias 17, 18 e 19 de Outubro, como forma de protesto. Divulga esta acção pelo teu grupo de amigos, família, escola, empresa, local de culto, grupo cultural ou desportivo... Não fiques sentad@...Este endereço de e-mail está protegido de spam bots, pelo que necessita do Javascript activado para o visualizar ACTUA!"

Virar de página - mais um passo

Entre os que se deixaram intoxicar pela onda de calúnia e difamação que me atingiu em 2003, muitos há que perceberam o logro em que haviam caído, embora haja outros que, teimosa ou perfidamente, insistem nele. Aos que estão na primeira situação, como António Almeida, não me custa nada aceitar os pedidos de desculpas, como os que publicou aqui e aqui.

27.9.08

Os três nãos do bloquista e as questões à esquerda

João Delgado responde-me, como bloquista, com três nãos: ao Euro, à União Europeia e à participação de Portugal na NATO. Diz que são temas "mais que clarificados" no Bloco. Acredito e, pessoalmente, lamento. Essas certezas clarificam: por enquanto o Bloco de Esquerda faz parte do problema e não da solução da governabilidade do país pela esquerda. O bloquista rebate-me com trechos de depoimentos de três socialistas "críticos" das políticas de educação, trabalho e saúde. Talvez espere de mim uma defesa cega de todos os passos dados. Engana-se. O espaço de um post não dá para desenvolver os tópicos, mas caso queira, esou pronto ao debate. Para abrir, deixo-lhe os meus pontos de partida sobre os três temas: 1. O PS nesta legislatura apostou na e desenvolveu a escola pública; procurou agir para que ela acolhesse melhor todas as famílias, diminuindo o abandono precoce e luta contra a real tendência deprivatização que resultaria do exodo das classes médias da escola pública nos meios urbanos. Aliás, o pior inimigo desta política educativa têm sido os neoelitistas, que nunca se deram bem com a escola pública democrática. Questão muito diferente, embora séria, é o modo como geriu a sua relação com os sindicatos e deixou desenvolverem-se tensões com os professores. 2. O Código do Trabalho de Bagão Félix é pior do que o que resultará desta revisão, embora este esteja aquém do que teria resultado das medidas defendidas pelo PS em Janeiro de 2003. As relações de trabalho não devem reger-se por um modelo legislativo autoritário que demonstrou ser capaz de conviver bem com a real individualização das relações de trabalho e tem que investir na negociação colectiva. Medidas mais progressistas, no entanto, tornam-se mais dificeis por a CGTP não ser, por agora, um parceiro credível na mesa das negociações quanto a este tema, ao contrário da UGT e dos parceiros patronais. 3. O Sistema Nacional de Saúde falido será uma prenda aos que gostariam de o ver destruído. A sua modernização tem que implicar um raciocínio de adequação à realidade económica e a padrões de qualidade clínica. Infelizmente o PS embrulhou algumas medidas fundamentais com uma retórica e outras medidas - de que a taxa moderadora sobre as cirurgias é emblemática - contraditórias. Se quiser vamos, ponto a ponto, com tempo e ponderação, debatendo estas e outras coisas com a profundidade que merecem.

22.9.08

Lendo o Público de domingo

A coluna do provedor do Público de ontem levanta uma luz razoável sobre as relações, a certos níveis, entre política e jornalismo. Ficamos a saber que há um canal aberto entre Belém e o jornal, que poderá explicar o exclusivo deste sobre a comunicação do Presidente ao país e a surpreendente entrevista monotemática a propósito do estatuto da Região Autónoma dos Açores. Afinal Cavaco Silva contactou o Público e impôs os termos da entrevista. O jornal aceitou a proposta. Pessoalmente, não creio que tenha violado nenhum princípio do jornalismo, embora acredite -mas é apenas uma convicção - que se tivesse recebido semelhante proposta do Primeiro-Ministro não reagiria da mesma forma e que a atitude em relação ao Presidente não joga bem com o que muitos leitores, como eu, esperariam do Público. Mas o jornal também demonstrou neste episódio as suas qualidades. O Provedor interrogou o Director sobre o critério jornalístico, teve uma resposta clara e informou os leitores. A pequena reprimenda ao Director que deixa na sua coluna, se é uma nota crítica para José Manuel Fernandes e uma informação importante sobre a relação de Anibal Cavaco Silva com os media, é também um elogio ao Público. Em quantos mais seria possível que tal crítica aparecesse tão cristalina, publicada no próprio jornal? Num país em que a auto-regulação dos media é medíocre, se admitirmos que existe, a atitude do jornal contrasta radicalmente, por exemplo, com tudo quanto, também no Público de domingo, em entrevista, José Eduardo Moniz disse sobre a "informação" da sua TVI. Foi de um cinismo atroz, de alguém que desrespeita violentamente direitos fundamentais das pessoas e ainda se orgulha de o fazer, de alguém que conta com a impunidade que o medo do seu enorme poder de retaliação provoca. Perante a capacidade de defender e banalizar o homicído cívico a sangue frio que Moniz aí ostenta, as declarações de Rangel há uns anos sobre o poder da SIC soam naives e a capacidade do Público nos informar sobre as condições em que produziu a entrevista presidencial têm um perfume de democracia e responsabilidade que o distinguem do quadro mediático nacional, por muito que se sinta que a linha editorial do jornal anda muito alinhada com um certo espaço ideológico e que nem sequer é o meu.

18.9.08

Os princípios do PS e o combate às discriminações

No tempo em que se discutiu a declaração de príncipios actualmente em vigor no PS, houve quem considerasse que o actual ponto 6 dessa declaração tinha uma formulação tímida. À luz dos debates que se aproximam em matéria de não-discriminação, ele parece-me meridianamente claro e orientador. Para um socialista, combater todas as discriminações é uma questão de princípio. Para quem tenha curiosidade sobre o que aí se diz, abaixo fica a transcrição: 6. O PS combate as desigualdades e discriminações fundadas em critérios de nascimento, sexo, orientação sexual, origem racial, fortuna, religião ou convicções, predisposição genética, ou quaisquer outras que não resultem da iniciativa e do mérito das pessoas, em condições de igualdade de direitos e oportunidades. O PS defende o princípio da equidade na promoção da justiça social. Para o PS, são ilegítimas e devem ser combatidas, sem hesitações, as desigualdades de direitos. E são ilegítimas e devem ser combatidas as desigualdades de condição e estatuto que não resultem da iniciativa e do mérito das pessoas, no quadro do aproveitamento de oportunidades abertas a todos. Desigualdades injustificadas entre classes e grupos e, por maioria de razão, a reserva de privilégios para certas classes ou grupos, ofendem a consciência humana e minam os alicerces da democracia. No combate às desigualdades ilegítimas ou indesejáveis e na promoção activa da igualdade de direitos e de oportunidades, o PS considera essencial a prossecução do princípio da equidade. Entende-se este como a exigência da intervenção pública a favor dos membros menos favorecidos da sociedade, no sentido de corrigir as desigualdades de resultados, criar regularmente novas oportunidades e assegurar níveis aceitáveis de coesão social.

O primeiro dia

No meu primeiro dia passado na nova sala das sessões do Plenário, qualidade dos debates à parte, percebi que se ouve muito pior o que se diz no hemiciclo quando se está lá sentado do que quando se segue os trabalhos pela televisão.

16.9.08

O populismo ainda comanda o PSD?

Esta imagem veio aqui parar de arrastão e foi apanhada em Setúbal. Como o PSD distrital de Setúbal é um mundo à parte, custa-me a acreditar que o cartaz tenha sido aprovado a nível nacional. Oxalá não me engane. Mas não há ninguém que pergunte aos porta-vozes do PSD se conceberam, autorizaram ou contemporizam com esta mensagem hiperpopulista? Atrevo-me a acreditar que a resposta seria embaraçada e embaraçosa. Caso contrário, não se perceberia porque substituiu o PSD Luis Filipe Menezes por Manuela Ferreira Leite.

14.9.08

Resposta a João Delgado, homem de esquerda

João Delgado tem coluna no esquerda.net e não ouviu a minha entrevista à TSF. Isso não o impediu de a comentar com base em pequenos excertos que apareceram em vários media. Não foi o único e não surpreende, uma vez que devemos sempre saber que há quem se preocupe em ouvir antes de ajuizar e quem esteja permanentemente com o dedo no gatilho. No caso concreto e no que interessa, João Delgado, homem de esquerda, por não ter ouvido, não pôde comentar o que eu disse e penso sobre os pré-requisitos que seriam indispensáveis para se poder sequer pensar num governo plural de esquerda em Portugal, um governo que ao mesmo tempo que seja de esquerda tem quer ser governo da República: aceitação dos compromissos decorrentos da participação no Euro, empenhamento na construção da União Europeia e participação na NATO. Oxalá agora diga o que pensa sobre essas três questões em vez de se limitar a discorrer a ladaínha dos que acham que a única esquerda é a sua, estejam onde estiverem.

Censura por simpatia - as partes omitidas da entrevista de Sarah Pahlin à ABC

A candidata republicana a vice-presidente ainda não tem o discurso sintonizado com as posições oficiais da sua candidatura e diz coisas que são contrárias aos interesses presidencial. Acontece! Mas a censura por simpatia do ABC arredondou-lhe as arestas problemáticas e as dissonâncias desaparecem, como que por magia. Transcrevo para aqui o excerto em que a s partes fala de modo potencialmente embaraçoso sobre a sua inexperiência no contacto com chefes de Estado. Mas há mais, sobre diverstos temas de política intenracional, nomeadamente em relação à Rússia, à Ucrânia, ao Irão ou à natureza de "guerra santa" da invasão do Iraque. O texto sem cortes de "censura simpática" está disponível online no site de Mark Levin. Há muito que se sabe que a relação dos media com a política não é neutra, mas tenho as maiores dúvidas que chegar a este ponto, nomeadamente num momento em que os cidadãos formam o seu juízo sobre um potencial governante, demonstra como essa mediação pode ser manipulatória e, por essa via se podem fazer ou (no caso, evitar) desfazer imagens e reputações. (No texto transcrito as partes cortadas da entrevista estão assinaladas a bold e sublinhado.)

GIBSON: Have you ever met a foreign head of state?

PALIN: There in the state of Alaska, our international trade activities bring in many leaders of other countries.

GIBSON: And all governors deal with trade delegations.

PALIN: Right.

GIBSON: Who act at the behest of their governments.

PALIN: Right, right.

GIBSON: I’m talking about somebody who’s a head of state, who can negotiate for that country. Ever met one?

PALIN: I have not and I think if you go back in history and if you ask that question of many vice presidents, they may have the same answer that I just gave you. But, Charlie, again, we’ve got to remember what the desire is in this nation at this time. It is for no more politics as usual and somebody’s big, fat resume maybe that shows decades and decades in that Washington establishment, where, yes, they’ve had opportunities to meet heads of state … these last couple of weeks … it has been overwhelming to me that confirmation of the message that Americans are getting sick and tired of that self-dealing and kind of that closed door, good old boy network that has been the Washington elite.

13.9.08

Não deixem apagar a memória - o que se passa em Espanha

Só me apercebi do debate em Espanha sobre a execução da lei da memória histórica ao ler este excelente post de Daniel Melo. Sem revolução, a democracia espanhola continua o caminho de reencontro com a sua memória. Também lá, não deixem apagar a memória.
O apuramento dos factos históricos e a busca da verdade não pode nunca fazer temer um democrata, seja de direita ou de esquerda. Acaba por surpreender a virulência da posição da direita e o absurdo da recusa da Igreja Católica de abrir à investigação os registos paroquiais de mortes. Como pode haver dúvidas de que temos o direito de saber o que ainda for possível sobre as viítimas da Guerra Civil que continuam "desaparecidas"?

12.9.08

A liberdade é um começo improvável

O que em geral permanece intacto nas épocas de petrificação e de predestinada ruína é a própria faculdade de liberdade, a pura capacidade de começar que inspira e anima todas as actividades humanas e constitui a fonte oculta a partir da qual se produz tudo o que é belo e grande” (Hanna Arendt, “O que é a liberdade?” in Entre o Passado e o Passado e o Futuro, Lisboa, Relógio d’Água, 2006, p. 180)
Hanna Arendt reflectiu sobre a questão filosófica da liberdade num dos oito ensaios escritos nas décadas de cinquenta e sessenta do século XX e recolhidos em Entre o Passado e o Futuro. A sua tese pode resumir-se a que a liberdade é um começo improvável, uma iniciativa, uma acção não prevista numa cadeia de causalidade, interrompendo uma sequência prevista e frequente. Esta concepção da liberdade tem interessantes consequências no campo da acção política. O que é, afinal, uma pessoa livre? A liberdade, assim vista, não é um gesto interior, um debate entre mim e a minha consciência, mas uma acção exterior uma interferência na vida colectiva. Como escreve Arendt: “os homens são livres – o que é diferente de apenas possuirem aptidão para a liberdade – enquanto agem, nem antes nem depois; pois ser livre e agir são uma e a mesma coisa.” (p. 164) Não se é livre sem usar a faculdade de ser imprevisto. Arendt entende que este é um dos motivos pelos quais o cristianismo iniciou realmente a história da filosofia da liberdade, identificando os “milagres” do Novo Testamento como exemplos da capacidade para imprevistamente transformar uma sequência de acontecimentos esperada. Nesta dimensão, o cristianismo encerra uma mensagem libertadora - testemunha e apela ao exercício da liberdade. De algum modo a questão vem do Génesis, pois o homem é a primeira criação depois da criação (como notou Santo Agostinho): Deus criou-o depois de ter criado o mundo e o homem criou a condição humana por, improvavelmente, desobedecer. Essa desobediência foi a fundação política da liberdade humana: agir de modo imprevisto e ser responsabilizado pelas consequências da sua acção, em vez de obedecer de modo previsível e ser recompensado pela passividade. O que nos conduz à questão da relação entre liberdade, política e história. Arendt escreve que, vista as coisas de fora da acção humana, “ as probabilidades de que amanhã seja igual a ontem são muito elevadas” (p. 182). No entanto, na história os seres humanos fizeram acontecer as diferenças entre amanhã e ontem, contra a teoria das probabilidades. Porquê? Porque, tal como escreveu na frase final do ensaio, os homens constroem essa diferença sendo livres, uma vez que “por terem recebido a dupla dádiva da liberdade e da acção são capazes de estabelecer uma realidade própria só deles” (p. 182). Ou seja, a liberdade é o exercício da faculdade de interromper uma cadeia causal pré-determinada, de um ser humano realizar um improvável começo de algo novo. Do meu ponto de vista, assim formulada, a liberdade é a vitória do gesto humano sobre os determinismos, da acção sobre a tradição. Algo simples, mas que precisa muito de ser cultivado para que haja coragem de fazer acontecer ao longo das nossas vidas individuais.

10.9.08

Entrevista à TSF

Esta tarde a TSF difunde uma entrevista minha de que avança excertos em vídeo na TSF online. Talvez pudesse trazer para aqui o vídeo, mas não sei como. Assim, aqui fica o link.

9.9.08

O vento de Leste mudou

Depois da notícia de que os tigres bálticos estão em forte desaceleração económica, a leitura do Ziarul Financiar (o principal jornal económico romeno) de hoje, não deixa margem para dúvidas. O Presidente do Banco central em entrevista nega que a economia do país corra risco de hard landing, dada a combinação de falta de mão-de-obra, aumento dos custos de produção, da inflação e do défice comercial e responde a perguntas sobre se as agências de rating vão mudar o país de classificação no risco de crédito. Embora o título da entrevista seja o de que a economia romena pode continuar a crescer a 6% ao ano, o discurso passou a defensivo e a sustentar que a política fiscal pró-cíclica deve ser contrabalançada por "outro pedal", na política de crédito restritiva. Ao mesmo tempo, dá-se notícia de que o défice comercial cresceu 10% nos primeiros sete anos face ao período homólogo, que o preço do m2 de habitação usada caiu 4% em Agosto e que o City Mall (um dos maiores centros comerciais) viu o seu valor de mercado desvalorizado em 24% desde que foi comprado por um grupo australiano e vai reconverter áreas de lazer para escritórios. Por outro lado, o grupo IKEA anunciou que vai fechar a fábrica de mobiliário que tem no país. Enfim, o vento de Leste mudou.

8.9.08

Outras questões políticas em torno da Abcásia

As férias impediram-me de comentar em tempo devido a questão de fundo nas fronteiras do império russo. O Miguel , a propósito dela, levanta outra questão política e tem razão no essencial. Não sou um purista ou um defensor intransigente da norma, mas quem queira obedecer a um padrão de grafia deve encontrar ponto onde se ancorar e concordo que o conceito de serviço público nos meios de comunicação deve incluir esta pequena mas não irrelevante questão. Diz Miguel: "Cada vez que surgem notícias de áreas geográficas pouco usuais, os diversos meios noticiosos portugueses utilizam na nossa língua várias grafias, consoante o gosto de quem redige (e/ou revê?) a notícia. Este lamentável estado de coisas é devido à total incapacidade para definir regras sensatas e segui-las, que tanto prejudica a nossa vida pública em muitas áreas. Já nem falo na nossa débil, quase inexistente, política da língua. Falo, por exemplo, da presença do Estado em organismos como a Lusa, a RTP e a RDP. Se existem essas entidades públicas sob o pretexto da “defesa do interesse público”, há que perguntar se não deveria estar contemplada nos respectivos contratos a obrigação de zelar pela correcta grafia dos diversos nomes que vão surgindo na actualidade noticiosa." Se não está, podia e devia estar. Se está, devia e podia ser muito mais vísivel.

Virar de página

Volto hoje ao trabalho e ao blogue. Entretanto foi dado mais um passo na minha luta pelo direito à dignidade, à verdade e ao bom nome. A sentença do Tribunal Cível de Lisboa (disponível online no site da Associação Sindical dos Juízes Portugueses) dá mais um passo, decisivo, na reposição da verdade a propósito da calúnia que sobre mim foi lançada e das suas consequências. Infelizmente não encerra este capítulo negro da minha vida, pois falta ainda saber quem, como, porquê e com que intenção urdiu a difamação. Mas, isso não está nas minhas mãos. Fiz tudo o que estava ao meu alcance para que a verdade seja apurada. Os processos pendentes continuarão. Mas é tempo de virar de página.