29.5.08

Carlos Minc, o pitbull e as armadilhas da imagem

O novo Ministro do Ambiente brasileiro é mais um bom conhecedor de Portugal. Passou por cá no PREC enquanto exilado político e fez bons amigos na esquerda a que se convencionou chamar extrema. Conversei com ele uma única vez, há unas anos,no Rio de Janeiro, porque lá tinha ido com um amigo seu dessa época. Da conversa para além das memórias que caracterizam todos os reencontros de amigos, guardo dois episódios. Carlos Minc fazia as suas campanhas eleitorais com dinheiro do seu próprio bolso e da sua família, com recursos extremamente limitados e achava que essa era uma limitação inultrapassável a que ideias como as suas se afirmassem na política nacional. Não lhe passava sequer pela cabeça dar esse salto. Mas, sintomatico mesmo da eficácia e astúcia mediática com que se fazia o combate político no país, foi a história que nos contou do que tinha acabado de acontecer-lhe num programa de TV. Á época Carlos Minc era um activista contra a liberdade com que se passeavam cães perigosos pelo Rio. Um tema fracturante e uma batalha que acabou por ganhar, com a lei que interdita a circulação desses cães na via pública a certas horas e regulamente o uso de mordaças . Nessa altura, foi convidado a ir ao programa de Jô Soares defender as suas posições. Jô, a velha raposa, deu-lhe todo o palco. Deixou-o expor quase sem contraditório todos os seus argumentos sobre a perigosidade desses animais e as suas características violentas e perigosas. Quando a entrevista estava a terminar, subitamente, um pitbull bébé entra em estúdio, salta para o colo do político e tem a performance enternecedora dos cachorros. Sem uma palavra, Jô arrasara toda a argumentação. Comparado com este profissionalismo, os grandes planos de Ferreira Leite são apenas tentativas desastradas de aprendizes de feiticeiro. Mesmo assim., Minc ganhou essa batalha e a sua lei passou. Agora vamos ver como se dá em Brasília. Andamos um pouco distraídos sobre a política brasileira, mas com a administração de Fernando Henrique Cardoso abriu-se um ciclo político no Brasil que conduziu à possibilidade de alguém como Lula poder ser Presidente e em que a defesa de políticas justas, corajosas e radicais se mistura com a gestão realista dos problemas com a qual quase toda a esquerda portuguesa - já que o PCP parece um caso perdido - podia bem aprender algo. Foto: Amisrael

Boas notícias: bombas de fragmentação banidas

Segundo os relatos, a Conferência de Dublin vaui aprovar um tratado banindo as bombas de fragmentação. Trata-se de um grande passo em frente, dado que estas bombas são particularmente letais para as populações civis, quer pela maneira como explodem (dispersando fragmentos por um raio alargado) quer porque as que não são detonadas e ficam no terreno, tal como acontece com as minas anti-pessoais, acabam por atingir, mais tarde, populações civis que buscam vidas normais. Mesmo sem que tenham participado na conferência os principais produtores e utilizadores destas bombas e(os EUA,a Rússia, a China, a India, o Paquistão e Israel), trata-se de um marco importante. Sob a égide das Nações Unidas, mais de uma centena de países apoia este tratado e o envolvimento do Reino Unido é da maior importância, até porque limitará a possibilidade do seu uso pelo aliado americano. O passo, significativo, está dado. É legítimo esperar que mais tarde ou mais cedo produza efeitos universais. Felizmente, foi assim com as minas. Oxalá a história se repita. (Foto: AFP)

27.5.08

Os derrotados em Sofia e a União Europeia

Apesar de a Bulgária ser a pátria de uma figura cimeira do internacionalismo proletário - Georg Dimitrov -, de muitos bulgaros o verem como um personagem importante e de lhe terem construído um mausoléu em apenas 6 dias, em 1949, quase nada restou dessa era no espaço público. Que me lembre, apenas uma ou duas estátuas irrelevantes e em locais secundarissimos. Em contrapartida, a diversidade religiosa que marcou secularmente a cidade sobreviveu ao século XX. Sofia, aliás, deve ser a única cidade da União Europeia na qual há uma mesquita em plena actividade em espaço nobre (a centenas de metros da Presidência da República e dos edifícios governamentais). No centro de Sofia, por outro lado, a mesquita coexiste com a sinagoga e as igrejas cristãs ortodoxas. Curioso, mesmo, é passar por ali numa tarde de sexta-feira. Uma parte dos crentes muçulmanos são eslavos e não turcos como o preconceito nos faria pensar. Bem perto, os descendentes dos judeus ibéricos que se acolheram à sombra protectora do sultão otomano vão à sinagoga expressamente desenhada para eles em traça mourisca no início do século XX. Mais longe, a grande catedral ortodoxa é neobizantina e foi construída em homenagem ao apoio russo à emancipação da Bulgária dos turcos. A Europa quando vista dos templos que persistem em Sofia e pisando a praça onde esteve o meusoléu arrasado, parece-me o carrefour dos que venceram o autoritarismo, aqui sob a forma de comunismo e não o espaço interior do cristianismo contrastante com o islão, como os teóricos das civilizações (seja na variante combate seja na variante diálogo) nos querem fazer crer. Deste ângulo, a Turquia só não pode ser Europa por não ser suficientemente democrática e não por ser "islâmica" ou pobre. Fotos (de cima para baixo): Mausoleu de Georg Dimitrov (construido em 1949, em 6 dias, arrasado em 1999), por C & M Bergfex. Catedral Alexandre Nevsky (construida entre 1904 e 1912), por Georg. Sinagoga (construída entre 1905 e 1909), por Ellen. Mesquita Banya Bashi (1576), por See.

25.5.08

A formação (militar) da Nova Europa

A empresa de sistemas de defesa Cubic Defense Applications fez saber que vendeu à Roménia e à Eslováquia material de formação militar idêntico ao que já tinha vendido à Hungria e que os seus produtos aumentam a operacionalidade militar na região por permitirem aos três países vizinhos treino millitar conjunto e entre eles e as forças americanas. Do ponto de vista militar, o Novo Continente continua a consolidar o alargamento da frente leste da Nova Europa. Um destes dias valerá a pena examinar, aliás, a redistribuição da presença militar americana na Europa depois do alargamento da NATO a Leste e das dificuldades levantadas pela Turquia à colaboração na invasão do Iraque. O guarda chuva americano, para o bem e para o mal "goes east".

Portugal? Fado

O fado é um dos símbolos nacionais mais vendáveis no estrangeiro. Não surpreende, pois, que esteja omnipresente nas iniciativas das nossas embaixadas: encanta os portugueses no exterior e atrai os nacionais dos diversos países. A Embaixada de Portugal na Roménia não é excepção. O ano passado trouxe jovens fadistas à Capital Europeia da Cultura, a Sibiu e agora volta a investir no fado para assinalar a semana portuguesa em Bucareste. Não pude ir ver o espectáculo mas não critico a iniciativa, bem pelo contrário. A minha experiência romena, trabalhando com equipas de diversos países, fez-me olhar de outro modo para a trilogia maldita que associamos à ditadura: Fado, Futebol e Fátima. A propósito, vem aí o jogo entre a selecção de Figo e a de um jogador romeno. Significados políticos internos à parte, os três efes são ainda a mais poderosa marca Portugal e bastar-lhe-ia juntarmos o vinho do Porto, o Algarve e a Madeira para dar conta da percepção imediata dos estrangeiros sobre nós. No que diz respeito ao fado, impressionou-me nestes últimos anos que ainda estivesse na memória dos romenos uma passagem de Amália Rodrigues pelo país a que muitos dos colegas na casa dos 50 anos aludem. É tão recorrente falarem dela como dos golos de Eusébio em 1966. Por acaso acabo de encontrar no youtube, videos desse concerto de Amália. Foi em 1969, ainda estávamos na ditadura e o PCP mudava de casa, de Bucareste para Praga. Ainda não tinha começado a "revolução cultural" que moldou o comunismo romeno que conhecemos. Não sei quem trouxe Amália, como a ditadura portuguesa reagiu à sua entronização num país comunista ou que discurso político a acompanhou no regime de Ceausescu, se é que o houve. Destaco desses vídeos a interpretação do barco negro. (não é possível fazer download). A história deste fado é também significativa de como as marcas se constroem. Esta "canção portuguesa"nasceu como uma toada brasileira sobre a escravatura escrita por dois sambistas, foi um êxito no Brasil nos anos 50, iniciou o percurso inverso da escravatura e foi gravada pelo Ouro Negro no início dos anos 60. A PIDE viu nela uma denúncia do colonialismo e não da escravatura e a música teve que mudar de letra: a sofrida toada da mãe escrava deu lugar às palavras fadistas da temente amante, num poema luminoso de Mourão-Ferreira. Mas, apesar de muitos dos seus admiradores o ignorarem, o fado "tipicamente português"também nasceu dos batuques dos escravos bantos trazidos para Lisboa e só se "casou" com a guitarra portuguesa séculos mais tarde, quando os ingleses a trouxeram, provavelmente para o Porto. .

Ideias de reforma da educação

Se as férias de Verão fossem mais curtas os resultados escolhares melhoravam e as razões pelas quais os resultdos escolares finlandeses são melhores que os ingleses incluem a focalização das escolas deste país no bem estar das crianças e o curriculo do período dos 5-7 anos incluir o desenvolvimento de actividades sociais. Veja aqui o video que apresenta as conclusões e aqui a entrevista com uma das autoras.

O representante do governo dos EUA não sabe quem ia nos voos militares americanos

Se não sabe pergunte, senhor Embaixador e depois dê-nos a resposta.

24.5.08

A arrepiante excepção americana

O New York Times está a publicar uma série de artigos sobre características do sistema judicial americano que o distinguem do resto do mundo. Nos artigos já publicados há histórias arrepiantes que vão do facto de haver pessoas condenadas a prisão perpétua por crimes cometidos aos 13 anos ou por ter emprestado o carro a um amigo que o usou para cometer um crime ao mais recente, sobre a eleição de juízes em que se dá conta do caso de um que utilizou na campanha eleitoral a alegação falsa de que o único juíz negro do Supremo Tribunal de Justiça tinha ajudado a libertar um violador negro. Não é, pois, acidental que os EUA tenham 5% da população total e 25% da população prisonal do mundo.

23.5.08

Não vemos, não ouvimos e não lemos, podemos ignorar

O governo e o eventual transporte de passageiros para Guantanamo através de Portugal. PS. Este blogue tem comentários moderados e não publicará nunca mensagens ofensivas. Casos há que exigem ponderação, como quando provocadores e difamadores aqui venham. Procurarei ter um critério uniforme: tratarei todos os comentários pelo que intrinsecamente representam. Se os comentários em si forem do domínio da expressão legítima de opiniões, ignorarei sempre o que quem os assina tenha dito ou feito noutros sítios, no momento de decidir publicá-los ou recusá-los. Por isso o blogger que dá pelo nome de Paulo Pedroso e que não sou eu, evidentemente, tem o seu comentário publicado abaixo apesar de possivelmente o ter feito convencido de que eu não o faria e de ser autor de muito lixo que aqui eu nunca publicaria.

A desigualdade de rendimentos da Letónia é maior que a nossa

O Portugal político-mediático acordou hoje em choque com a possibilidade de ser o país com maior desigualdade da União Europeia.
Mas Portugal é mesmo um país com um nível de desigualdade elevado. Já o é há muito tempo e nada leva a crer que esteja a caminho de deixar de o ser.

A dinâmica económica do país continua ligada a fortes disparidades salariais, não apenas entre categorias profissionais como, sobretudo, entre sectores modernos e sectores tradicionais, mesmo para níveis de qualificações comparáveis.

O modelo político é o mesmo há décadas. Assenta num nível de fiscalidade modesto que limita a intervenção redistributora do Estado. Obedece a um modelo de política social estatutário, isto é, que reproduz nos benefícios concedidos a desigualdade pré-existente nos salários, magramente complementado por mecanismos de alívio da pobreza extrema. É, portanto, natural que os níveis de desigualdade oscilem em torno de um padrão que se mantém, como se vê nos dados do coeficiente de Gini que hoje se colhiam na base de dados do Eurostat.

Se mudarmos de indicador podemos alterar ligeiramente os resultados, mas a leitura será sempre a mesma: Portugal é um país muito desigual. No Canhoto vários de nós o andam a escrever isso mesmo há muito tempo.

Se não se quiser tentar tapar o sol com uma peneira, há que dizer claramente que só uma crise económica acentuada ou uma mudança de modelo social drástica alterará o facto.

O primeiro factor é indesejável, o segundo não tem protagonistas que o defendam, porque só acietam uma ou outra d eum conjunto de medidas que só se tomadas solidariamente produziriam efeitos.

Quem vai pedir aos portugueses que se aumente o peso dos impostos no PIB? Ou que, com esse dinheiro, se crie uma pensão básica que retire da pobreza uma percentagem significativa de pensionistas e se redireccione as prestações sociais para o reforço da clase média em vez do apoio anémico aos grupos mais desfavorecidos?

Quem vai defender o acesso universal e gratuito de todas as crianças a serviços colectivos de guarda e educação, democratizando cuidados educacionais que nas famílias reporduzem brutal e inelutavelmente as desigualdades? Quem vai defender que a educação deve precupar-se pelo menos tanto com os que têm dificuldades graves como com a promoção dos alunos excelentes e deve diminuir o nível de reprovações e de abandono?

Quem vai pedir aos portugueses mais progressividade na taxa de imposto e mais impostos sobre transmissão de património para prevenir a reprodução geracional de privilégios e obter receitas dirigidas à redistribuição de rendimentos?

Quem vai impulsionar uma subida no salário mínimo que o coloque numa percentagem substancialmente mais elevada do salário médio e financiar o risco de desemprego dos actuais detentores do salário mínimo que possam ser condenados ao desemprego?

Quem vai sustentar maior flexibilidade no trabalho para compensar os custos acrescidos das políticas sociais minimizando impactos na competitividade?

Quem vai defender a redução drástica dos orçamentos na função de soberania, por exemplo na defesa ou no consumo público, que financia sectores ineficientes, para reorientar recursos?

Quem vai eliminar os subsídios abertos e ocultos, a cartelização e as ineficiências económicas provocadas pela falta de concorrência em actividades económicas escandalosamente lucrativas à custa das classes médias?

Quem vai defender que os cidadãos devem ser apoiados por tempo indeterminado desde que tenham uma perda significativa de rendimentos e demonstrem disponibilidade para o trabalho?

Quem vai contrariar a tendência para a privatização dos cuidados de saúde e aceitar que os transportes colectivos dedvem ser financiados pelo Estado de modo mais generoso?

O nosso problema de desigualdade também passa por todos achamos natural que os mais pobres sofram as consequências da sua pobreza, todos querermos transmitir aos nossos filhos o bem-estar que construimos ao longo das nossas vidas, todos aceitarmos pagar fortunas por serviços que deveriam ser subsidiados e todos nos queixarmos mais dos impostos do que dos juros dos empréstimos bancários ou das margens de lucro de actividades especulativas.

Por tudo isto o meu prognóstico é o de que Portugal continuará a ser o país mais desigual da Europa, a menos que outros caminhem para o aprofundamento das suas desigualdades.

No fundo, o que hoje chocou Portugal não foi a desigualdade mas a ferida no orgulho nacional que sempre provoca a ideia de sermos os últimos no que quer que seja. Se não fosse isso, não havia notícia. Assim sendo, para nosso descanso, aqui fica a correcção: a desigualdade de rendimentos da Letónia é maior que a nossa!




Fonte: Eurostat

21.5.08

"A revolução que ninguém sabe se houve

José Pacheco Pereira dá conta de um livro sobre a revolução que, como diz, “ninguém sabe se houve”. Na Roménia, continuando muita informação relevante inacessível, ouvem-se as mais fantasiosas teorias sobre o que aconteceu ao regime que alguns acham que caiu e outros que se atirou ao chão.

Steve Elmer Trio

Keep your eye on the ball

20.5.08

A Mercedes na Roménia sem esperar pelas auto-estradas

Diz-se por aqui que a Daimler está perto de decidir instalar-se em Cluj ou em Timisoara para construir os Classe A ou os Classe B. Concretizando-se, será a maior fábrica automóvel da Roménia e consolidará significativamente o cluster automóvel que já conta com a Renault e, agora, a Ford, bem como com a deslocalização progressiva de empresas de componentes. Do ponto de vista do desenvolvimento económico do país é mais um sinal de que a indústria tenderá a olhar para Norte, sem esperar pelas auto-estradas que hão-de pôr a fronteira a poucas horas dos grandes mercados do centro europeu. Bucareste pode, com o tempo, vir a ser a capital administrativa localizada a sul de um país com o PIB a Norte. Nada que não se gira, mas a que os potenciais investidores que não se concentrem no curto prazo devem estar atentos na hora de definirem para onde ir.

19.5.08

A Companhia e o Estado

Na sequência dos posts que tenho dedicado à Rússia, à Alemanha e à Gazprom, chegou-me o link de um artigo que saiu no New York Times, que é bem elucidativo da fusão entre a Companhia e o Estado. Quem se mete com a Gazprom leva. Ou será com a Rússia?

17.5.08

O natalismo como política oficial

O Governo tem tomado medidas que visam aumentar a natalidade. Independentemente dos méritos de cada uma delas, é uma resposta adequada à conjuntura. Defendo que o Estado não deve ter política natalista. Deve respeitar a diversidade de escolhas e a liberdade individual. Cabe-lhe apenas apoiar os cidadãos para que não ocorra, de facto, uma política anti-natalista por omissão, isto é, para que as circunstâncias não forcem à renunciar à paternidade e à maternidade, por impossibilidade material - falta de assistência médica, escassez de rendimentos, inexistência de serviços acessíveis e a preços comportáveis. Neste sentido, o investimento em serviços públicos e o aumento do montante das prestações familiares são medidas adequadas e positivas. Tão importantes como seria o encorajamento a que os horários de trabalho se não estendessem recorrentemente para horas anti-sociais ou os aperfeiçoamentos na protecção na paternidade e na maternidade que reduzam a décalage de tempo fora do trabalho entre mulheres e homens, porque esta última, parecendo positiva, resulta em maior discriminação das mulheres no mercado de trabalho. O que é manifestamente excessivo é erigir o natalismo em política oficial. Tal como seria o seu contrário. Deparando-me com o conteúdo do Artº 27º da Lei de Bases da Segurança Social (ver infra), sinto que já se foi longe de mais nesse caminho. Por este andar, na próxima revisão constitucional, alguém se baterá por um artigo que institua o natalismo como política do Estado. Artigo 27.º Promoção da natalidade 1 - A lei deve estabelecer condições especiais de promoção da natalidade que favoreçam a conciliação entre a vida pessoal, profissional e familiar e atendam, em especial, aos tempos de assistência a filhos menores. 2 - As condições a que se refere o número anterior podem consistir, designadamente, no desenvolvimento de equipamentos sociais de apoio na primeira infância, em mecanismos especiais de apoio à maternidade e à paternidade e na diferenciação e modulação das prestações. Querendo, leia a lei na íntegra. Em geral é bastante boa e revoga a contra-reforma da segurança social ensaiada por Bagão Félix.,

15.5.08

Pop, swing e Garbarek

Esta noite fui ver o Jan Garbarek Group featuring Manu Katche, no Palácio Nacional da Cultura de Sofia. O concerto teve momentos de jazz, mas abriu bastante eléctrico e fechou a swingar, para voltar ao cânone Garbarek no encore. Nunca tinha ouvido esta formação, cuja dinâmica se aproxima mais da pop que do jazz. O primeiro protagonismo foi da bateria. Mas Manu Kache não faz o meu estilo. É (ou foi aqui) demasiado seco, muito enérgico mas pouco subtil. O melhor desta fase acabou por ser o "solo a trio" do baixo, que gravou ali mesmo o refrão e uma segunda frase e sobrepôs o solo propriamente dito à repetição do ritmo. O concerto já levava quase uma hora quando passou a uma fase zen: a tela que fazia de cenário passou de tons azuis a laranja e brilhou o dueto saxofone-piano. O piano pensativo e a harmonia das escalas do saxofone deram-me os melhores momentos da noite. À medida que a segunda hora de música avançava, os sons abriram-se a um pop festivo em que a bateria voltou, francamente mais a meu gosto, e os músicos swingaram, enquanto a tela ruborescia. Foi pena que não tenha resultado a passagem pelos sons folk, porque ao momento da flauta campestre faltaram outras percussões. No fecho, ouviu-se o cânone Garbarek e o encore foi, naturalmente, do líder. Sem ser um concerto fabuloso, a noite passou-se bem. Reparo no ócio, que a banda passou, no ano passado, pelo Guimarães Jazz.

14.5.08

Para já, não

Para já, não está em causa a alienação do Millenium na Roménia nem na Grécia, depreende-se da entrevista de Carlos Santos Ferreira, CEO do grupo, à Reuters, reproduzida hoje no jornal económico gratuito OJE.

Contudo, a alienação de activos não é completamente excluida da estrate´gia que levou ao aumento de capital. Diz Santos Ferreira: “Quando optámos por fazer o aumento de capital, uma das razões porque o fizemos foi para podermos pensar sem ser debaixo de pressão relativamente aos activos que incluem, naturalmente, as operações internacionais. As alternativas clássicas, quando é necessário reforçar o core-Tier1, passam sempre pela alienação de activos ou por aumentar o capital, e uma das razões porque apontámos para o aumento de capital foi não ter de alienar activos sobre pressão.

Que lugar terão as redes do sudeste europeu na estratégia do grupo quando a pressão diminuir? Saberemos mais tarde.

7.5.08

Notícias cruzadas

Hoje de manhã era notícia na Roménia que a Comissão Europeia acusa Portugal de criar dificuldades à livre circulação de trabalhadores por não ter transposto a directiva que estende o reconhecimento automático de qualificações dentro da UE à Roménia e à Bulgária (processo em que temos a companhia de vários outros Estados-membros). Hoje à noite já era notícia em Portugal que o CFR Cluj acabou de ganhar o campeonato de futebol com uma equipa onde alinham 10 portugueses que beneficiaram da mesma livre circulação de trabalhadores. Felizmente para os adeptos do CFR Cluj e infelizmente, por exemplo, para os doentes portugueses a Roménia não pode defender-se da livre circulação de jogadores com o mesmo empenho com que Portugal consegue resiste à livre circulação de médicos.

6.5.08

O clima económico da Roménia

Desde o início do ano que se sente que algo está a mudar no clima económico da Roménia.

Talvez o primeiro sinal de alarme tenha tocado com os conflitos laborais na Dacia e na Mittal, como a Reuters (via Romania News Watch) agora recorda. Tratou-se de conflitos pesados, que se saldaram por acordos salariais dificilmente imagináveis se não estivéssemos numa economia sobreaquecida e em risco de espiral inflacionista. Esta semana, os jornais locais deram destaque à análise do FMI da situação da economia romena. O sentido é claro: a dependência da economia romena dos fluxos de capital estrangeiro tornou-se uma vulnerabilidade na conjuntura, a política fiscal é pró-cíclica, há dois estrangulamentos que exigem respostas de médio prazo, na construção de infraestruturas e na qualificação da força de trabalho e o crescimento económico começará a ressentir-se da pressão conjuntural começando a desacelerar já em 2008 e desacelerando ainda mais em 2009. A análise do FMI reflecte a crueza dos indicadores, que já em Março as estimativas não oficiais do banco Unicredit Tiriac antecipavam.

O cocktail de políticas do FMI é bem menos imaginativo – centra-se nos riscos da política fiscal apesar de ter identificado como constrangimentos estruturais os das infraestruturas e das qualificações. O sentido das recomendações é racional, dado que a contenção do défice é necessária e a Roménia vai entrar num ciclo eleitoral prolongado, a partir das eleições locais cuja campanha eleitoral já começou.

Errado, mesmo, é o emblema que o FMI escolheu para a sua causa. A medida a que se opõe mais energicamente é a redução do IVA sobre bens alimentares de primeira necessidade, cuja incidência o Senado votou baixar de 19 para 5% (a Roménia não tem, actualmente, taxa reduzida de IVA), com um custo fiscal que o FMI estimou, seguramente não por defeito, em 0,5% do PIB Mas não se podia esperar nada de muito diferente, embora choque a sensibilidade de quem pensa que seria melhor propor medidas que contrabalançassem essa perda de receita.

5.5.08

Misturar alhos com bugalhos

Circula on-line um "manifesto em defesa da língua portuguesa contra o acordo ortográfico". Começo por dizer que não tenho posições definitivas sobre este ou qualquer acordo ortográfico. A ortografia é uma convenção e, como todas as convenções, discutível, passível de aperfeiçoamentos, correcções e também sujeita a formulações deficientes ou erradas. Os promotores do manifesto consideram que o Acordo Ortográfico em cujo processo de ratificação estamos é "uma reforma da maneira de escrever mal concebida, desconchavada, sem critério de rigor, e nas suas prescrições atentatória da essência da língua e do nosso modelo de cultura". Concedo facilmente aos peritos que considerem esta reforma mal concebida ou desconchavada sem grandes fundamentações, mas de vultos tão importantes do nosso panorama cultural esperaria uma razoável demonstração de como será atentatória da essência da língua e, até, do modelo de cultura. Percorrendo o manifesto encontro três críticas concretas ao conteúdo do Acordo: a) "É inaceitável a supressão da acentuação, bem como das impropriamente chamadas consoantes “mudas” – muitas das quais se lêem ou têm valor etimológico indispensável à boa compreensão das palavras." b) "Não faz sentido o carácter facultativo que no texto do Acordo se prevê em numerosos casos, gerando-se a confusão." c) "Convém que se estudem regras claras para a integração das palavras de outras línguas dos PALOP, de Timor e de outras zonas do mundo onde se fala o Português, na grafia da língua portuguesa.// A transcrição de palavras de outras línguas e a sua eventual adaptação ao português devem fazer-se segundo as normas científicas internacionais (caso do árabe, por exemplo)." Todas estas críticas me parecem razoáveis, mas nenhuma delas fundamenta tão acesa retórica. A mim, pessoalmente, parecem-me ter imanente apenas a concepção de que a língua portuguesa é um património específico de Portugal e não o instrumento de um condomínio histórico gerido por um conjunto diverso de nações livres e soberanas. Aceito a ideia de que podemos ficar orgulhosamente sós, se quisermos prescindir da mais-valia cultural da unificação ortográfica dos que têm como pátria a língua portuguesa. No entanto, seguindo por esse caminho, não estaremos a ser muito universalistas. Não quero entrar demasiado na discussão das soluções concretas encontradas, que admito com facilidade que sejam deficitárias. Mas o que temem os peticionários? Querem controlar a grafia das palavras que entram no português a partir de línguas africanas? Ignoram que já hoje a ortografia portuguesa não segue a pronunciação? Se fosse por causa do Acordo Ortográfico, o manifesto não me entusiasmava nem me incomodava muito. Mas irritou-me a deliberada mistura de alhos com bugalhos que nele se faz, quando se chama à colacção o "sistema educacional", que deve ser o sistema educativo que saiu da Lei de Bases aprovada por unanimidade na Assembleia da República em 1986. Logo a abrir o manifesto diz-se que o Estado "desagregou o sistema educacional, hoje sem qualidade". Pergunto-me de que desagregação estarão os peticionários a falar e a que qualidade da educação do passado se reportarão. Será a do período do experimentalismo pedagógico sem enquadramento sistemático que durou de 1974 a 1986? Será a do tempo do ensino liceal só para escassas minorias dos tempos da ditadura? Quando se terá começado a desagregar o sistema educativo de qualidade que tivemos no passado? Com a substituição de Hermano Saraiva por Veiga Simão, ou ainda antes, com a chegada ao Ministério do pai das epxeriências pedagógicas, o Minsitro Galvão Teles? Ou terá sido só com o prolongamento da escolaridade obrigatória para nove anos no tempo da primeira maioria absoluta de Cavaco Silva? Admito que uma parte dos peticionários tenha um conhecimento muito distante do sistema educativo e da sua evolução e que se sintam tocados por um aspecto que destaquem do todo e se agigante aos seus olhos. Parece ser o que se passa com as discordâncias sobre o papel da literatura portuguesa no currículo. Recordaria que as reformas curriculares são precedidas de muito trabalho de peritos e controvérsias técnico-científicas, não são despóticos actos de vontade deste ou aquele ministro. Acrescento, por outro lado, que acredito que o Plano Nacional de Leitura é uma medida bem conseguida de aproximação dos jovens à literatura. Mas é natural que os que confundem currículo e escola possam, ao mesmo tempo estar, por exemplo, contra as aulas de substituição e a favor de que o que está fora do currículo está fora do sistema educativo. Francamente, acho que a qualidade do sistema educativo foi chamada ao manifesto a despropósito e apenas porque é um argumento ad-hoc que dá jeito para tentar cavalgar ondas de descontentamento. Ou seja, é uma proclamação retórica sem a seriedade que o tema do Acordo Ortográfico e as responsabilidades cívica dos signatários da petição exigiriam. Apetece pedir aos signatários que tirem a tirada demagógica sobre a educação da petição, que não misturem alhos com bugalhos, mas confesso que não acho a confusão involuntária nem ingénua, apenas infeliz. (escrito no Canhoto)

4.5.08

A paternidade oculta

Quem quiser encontrar os apoios à paternidade na página web da segurança social portuguesa , verá que fazem parte das prestações de... maternidade. Não custa nada mudar o título do capítulo.