24.1.13
Sobre a estratégia do PS para sair da crise
A sucessão de Sócrates no PS foi decidida pela conjunção entre a enorme vontade de ser líder de António José Seguro e o fatalismo de uma legião de quadros intermédios e superiores do partido aterrorizados pela ideia de passar algum tempo fora do poder, mesmo que o micropoder de um partido de oposição.
Passados quase dois anos, importa reflectir sobre o posicionamento estratégico da direcção do PS em relação à crise e às respostas a ela.
Apesar de o memorando com a troika ser da co-autoria do PS, o partido remeteu-se ao silêncio distante quando não à crítica aberta ao seu conteúdo, desvalorizando a negociação que fez, não defendendo com convicção nenhuma das propostas nele contidas e, sobretudo, não pontuando, como acho que era seu dever, a diferença entre o que efectivamente constava do memorando e o que lhe foi sendo acrescentado, desvirtuando os equilibrios nele contidos e pondo em marcha o programa próprio do PSD. Também não vimos o PS - nem nenhuma outra força - apresentar balanços próprios da sua execução, e de como as àreas socialmente mais penalizadoras foram avançando e outras que faziam reformas contra poderes fácticos foram sendo adiadas ou esquecidas.
A gestão do memorando com a troika foi assumida exclusivamente pelo PSD e o CDS e nos seus termos. O PS remeteu-se para a "atitude responsável", a defesa da "credibilidade do país", a "abstenção violenta", numa pose que não foi nunca a jogo na defesa de nenhuma alternativa. Em que encontramos a alternativa do PS ao governo? IVA mais baixo na restauração, imposto extraordinário sobre as PPP, subida mais ténue dos impostos, mais tempo e juros mais baixos para aliviar a espiral recessiva e pouco mais.
Esta atitude alimenta a ficção de que o país não precisa de reformas, prolonga o embuste de que o país precisa apenas de cortar as famosas "gorduras do Estado", tem subjacente uma atitude conservadora sobre a reforma do nosso modelo social e é incapaz de definir novas direcções de reformas necessárias para um ajustamento que, como todos, terá que ter alguma dose de dor.
O posicionamento estratégico do PS tende a ser o dos derrotados que reclamam vitória moral, alicerçado na ideia de que os outros estão a fazer o que faríamos, mas sob nossa influência espiritual e com um ano de atraso. O PS nem está abertamente nas ruas, quando protesta, nem corajosamente na concertação de interesses, quando negoceia.
É verdade que o PSD se afastou de quase todos os consensos institucionais prévios e aparece hoje isolado ao país. Mas não é menos verdade que a alternativa à sua deriva liberal não é a miragem da conservação do desequilibrado e em alguns aspectos dificilmente sustentável modelo social que temos,
É verdade que não há solução estritamente nacional para uma crise que é - e sempre foi - internacional e, neste ponto, Seguro começou com um elevado elan europeu que parece, contraditoriamente, ter começado a desvanecer-se com a vitória de Hollande.
Neste contexto, nos últimos dias, o PS parece ter assumido dois erros de monta.
Aliado à irresponsabilidade à sua esquerda, recusa-se a integrar uma Comissão Parlamentar de Reforma do Estado, boicotando uma discussão em que há que denunciar a agenda do adversário e ter agenda própria e não que defender o corolário conservador da bondade do que existe. Apenas uma séria razão de Estado deve fazer um partido parlamentar recusar integrar uma comissão parlamentar. A banalização desse gesto diminui, o partido, o Parlamento e a democracia.
Aparentemente surpreendido com o marketing político do governo em relação à melhoria das condições do programa de estabilização tenta tirar uma pequena fatia dos louros do "sucesso" em vez de interrogar o governo em que é que ele melhorará a situação do país ou é sinal de alteração de rota. A que nova politica de crescimento e emprego está associado? A que redução da espiral recessiva vai ser associado por quais novas medidas? Que parte dos trágicos cortes na despesa pública social anunciados será eliminada? Que benefício terão os portugueses em 2013 e 2014 desta melhoria de condições? E tudo aponta para que todas estas perguntas terão resposta negativa, afirmando mais a necessidade de alteração de rumo e não de partilha de "sucessos" de Passos Coelho.
Perante tudo isto, "qual é a pressa" de haver eleições internas no PS? Nenhuma. Vai haver, em Maio, Julho, Novembro ou mesmo em Janeiro do ano que vem porque António José Seguro cumpre dois anos de mandato em Julho e a democracia não foi suspensa no partido. É contraditório dizer-se que se está a acelerar prazos de apresentação de propostas e simultaneamente estar-se a atrasar a relegitimação ou substituição, que inevitavelmente terão que ocorrer, dos protagonistas. Mas não é a primeira nem a mais importante das contradições. Marcar eleições é uma responsabilidade do líder, que deve ler a sensibilidade do partido e do país e tomar decisões. O que não precisamos é de juntar aos problemas sérios de Portugal um tabu partidário risível.
Passados dois anos de governo PSD-CDS importa-me mais saber que alternativas de reforma apresentamos e que solução de governabilidade propomos. Oxalá apareçam no momento certo tantos candidatos a liderar o PS quantas essas alternativas e os socialistas decidam quem ganha a pensar na relevância do partido para o futuro do país. Seria uma ruptura séria com o tacticismo que adormeceu o partido há uma década e contagiou a maior parte senão todos os seus principais dirigentes de então e de agora.
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3 comentários:
"Esta atitude alimenta a ficção de que o país não precisa de reformas, prolonga o embuste de que o país precisa apenas de cortar as famosas "gorduras do Estado", tem subjacente uma atitude conservadora sobre a reforma do nosso modelo social e é incapaz de definir novas direcções de reformas necessárias para um ajustamento que, como todos, terá que ter alguma dose de dor."
Gostava que Paulo Pedroso clarificasse um pouco o que entende, no texto acima, por "atitude conservadora na reforma do nosso modelo social", pois receio que tal crítica venha a resultar em medidas de redução ainda maior da protecção que é devida aos cidadãos... e não apenas aos "pobrezinhos", aos "dependentes" e por aí fora.
24/012013 Cláudio Teixeira
Apenas para dizer, que é com racionalidade e tom elevado que a ALTERNATIVA deve ser discutida, ponderada e sufragada !
Que estas posturas façam o seu caminho, são os meus VOTOS e EMPENHOS!
Debate SIM, guerras NÃO !
zca.
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