Sem surpresa, as sondagens vão começar a penalizar violentamente o Governo PSD-CDS. Como penalizarão relativamente cada um dos dois partidos depende da habilidade política que tenham para se distanciarem um do outro sem partirem a corda por cujo nó estão atados um ao outro. Portas já demonstrou que tem muito mais habilidade para gerir o jogo distância-pertença que Passos, embora também seja verdade que para isso tenha que ter sabido engolir em silêncio algumas desconsiderações e minimizações que lhe deram espaço e foram erros tácticos de palmatória do PSD. Exemplos? Basta o afastamento de Portas do Conselho de Estado.
A descida nas sondagens é a consequência inevitável do anúncio do mais violento Orçamento em décadas. Promete-nos menos investimento, menos consumo público e mais impostos, logo redução substancial do rendimento disponível, contracção forte do mercado interno e atraso face aos competidores. Estamos a emagrecer no presente e sem preparar o futuro. Não havia maneira de apresentar de forma simpática este programa. Mas o Governo, vá-se-lá saber porquê, fez os possíveis para maximizar os estragos. Tentou um bónus aos empresários à custa dos trabalhadores, na TSU, mas fazendo deles os antipáticos cobradores do seu próprio benefício. Num momento de todas as angústias no sector imobiliário avançou para recuar num aumento brutal do IMI, etc., etc.
O maravilhoso povo português reagiu como tem feito na história recente. Passou repentinamente da passividade resignada à explosão indignada. Que sondagens boas poderia ter um Governo que tem que andar ostensivamente rodeado de seguranças para dizer bom-dia aos eleitores e teme a todo o momento que mais um incontrolado lhe atire um impropério ou mesmo um ovo?
Novidade mesmo, foi o abandono do barco pelas hostes cavaquistas, ex-líderes do PSD, ex-Ministros de Durão Barroso e outros, de que são talvez paradigmáticos os discursos de Ferreira Leite, Marques Mendes ou Bagão Félix, mais inflamados que os dos dirigentes da oposição
Passada esta onda de indignação, algo que imagino que aconteça pelas festividades do Natal, pouco dadas a grandes manifestações e caindo alguma chuva e frio sobre os protestos, o que acontecerá?
A experiência demonstra que o Governo tem espaço para reagir. Depois de ter caído a um patamar baixo pode aplacar os espíritos, talvez remodelar, tomar iniciativas simbólicas de mudança de rumo, apresentar algumas iniciativas ainda que limitadas que demonstrem que tem coração sensível, explorar janelas de oportunidade que segmentos da oposição lhe estendam. Acham impossível? Lembrem-se de Joaquim Ferreira do Amaral, ministro de Cavaco, de braço dado com Maria Emília de Sousa em Almada pouco tempo após o buzinão da Ponte 25 de Abril ou o anúncio nessa mesma época em que o Governo era também acusado de insensibilidade social da erradicação total das barracas na Àrea Metropolitana de Lisboa.
A experiência também avisa, como todos os sindicalistas experimentados sabem, que a ressaca dos grandes protestos pode ser terrível. Haverá sempre uns extremistas a querer radicalizar os conflitos até ao absurdo, seguidos por cada vez menos gente. Não terá sido a manifestação da CGTP em cima da de 15 de Setembro um sinal precoce desse risco? E pode haver o sentimento de desalento de que tudo se perdeu, incluindo a energia para protestar. A oposição precisa de algum ganho de causa e que a indignação baixe para que não seja também ela arrastada no furacão, passageiro mas forte, da indignação popular. A gestão do protesto por quem não tem meios para o levar às últimas consequências nem interlocutor para o gerir não é a mais fácil das tarefas políticas.
Por tudo isto, Passos Coelho tem o ónus da iniciativa política nas próximas semanas e a sua capacidade para ser criativo ditará o seu destino e o do país em 2013. Tem condições para, depois da abrupta queda nas sondagens, iniciar uma lenta, esforçada e progressiva recuperação. Como se diz no futebol, depende só de si próprio para que assim seja, pelo menos até que seja visível que o Orçamento de 2013 também não será cumprido ou se torne inevitável um segundo resgate e a troika peça para ele a co-assinatura do PS. Terá Passos o engenho e arte para retomar a iniciativa e minimizar os danos?
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