7.7.09

Semidemocracia islâmica ou ditadura? Os futuros imediatos do Irão.

A notícia de que a disputa política em torno dos resultados das eleições presidenciais do Irão tem implicado, de ambos os lados, os clérigos, vem confirmar que estamos perante fracturas internas do regime. O país é uma semidemocracia, com elementos de pluralismo político, tutelada pela hierarquia religiosa. Ao que parece, há agora uma fractura entre sectores que se reivindicam da herança espiritual da revolução islâmica, como os intelectuais que a apoiaram e serviram os seus primeiros governos e os clérigos que a teorizaram e os que se cimentaram nos poderes "seculares" que esta gerou, como os guardas da revolução e o exército. Ao contrário do que poderia imaginar um ocidental desatento, é nos sectores "espiritualistas" (ou islamistas se preferirem), que o descontentamento popular tem mais eco e nos "seculares" (o aparelho militar-policial) que estão os novos duros do regime. Os primeiros têm uma visão da sua "revolução" que assenta na necessidade de renovar a sua legitimidade e de enquadrar o povo no seu projecto político, bem como a sua ambição de hegemonia os leva a perceber o que tem que mudar para que o regime possa persistir. Os segundos têm apenas a consciência do que podem perder se o poder lhes sai das mãos. Não sabemos se o regime vai conseguir reenquadrar o descontentamento, particularmente nos meios urbanos e persistir como semidemocracia com legitimidade popular ou vai evoluir no sentido da ditadura, prescindindo dessa legitimidade e forçando um ciclo de repressão que pode ser duradouro. Em nenhum dos casos se tornaria numa democracia secular, mas no primeiro deles seria um parceiro mais previsível no cenário internacional. Porque quando uma ditadura tenta reganhar apoio popular fá-lo sempre pelos mais cruéis populismos internos e por gestos internacionais altamente simbólicos mas irresponsáveis. Com Amadhinejad acossado internamente, mantido no poder pela força policial e sem a benção de parte significativa do clero, o mundo tem um factor adicional de crise, que se dispensava. Acresce que não se pode prever com rigor como reagirão os movimentos que gravitam na sua órbita, como o Hezbollah, à divisão que atravessará nesse caso o país, como isso interferirá na estabilidade do Líbano e, necessariamente, em todo o Médio Oriente. De facto, a questão de legitimidade também os afecta porque têm uma filiação ideológica no regime iraniano. Os países aliados, esses, serão imunes à questão. O que liga, por exemplo, a Síria ao Irão não é nenhuma visão do Islão e muito menos a Rússia fragilizará a sua aliança com o regime por este se tornar mais ditatorial.

2 comentários:

ATG disse...

Porque é que os ocidentais, ao contrário de chineses e indianos, têm o triste hábito de se ingerirem na política interna dos outros que nada têm a ver connosco?

P. disse...

Ao contrário do que pensa ATG, não posso achar que, neste mundo tão pequeno, os outros "nada têm nada a ver conosco".

Daí a interferirmos, concordo que vai um grande passo.

Poder dos religiosos ou dos militares? Só antevejo que será o poder de uma elite contra a vontade de uma grande massa. Não digo de toda a população: julgo perceber que há uma percentagem que se acomoda com a repressão.
Acredito que eles se limitem a continuar como até aqui, com a sua revolução silenciosa: menos dois centimetros de véu, mais uma camada de make-up, mais um par de namorados que passeiam juntos, mais uma peça de roupa colorida.
Acho que não tinha diminuído a % de mulheres nas universidades.

Talvez se chegue a algum lado.