17.5.11

Acha bom para o país que demoremos um século a chegar ao nível europeu de conclusão do 12º ano?

O sector da educação está pejado de neoelitistas que tremem interiormente perante a ideia da generalização do ensino secundário.
Muitos dos que assim pensam sobre a "sua" escola compaginam o seu sentimento interior com discursos politicamente correctos de que Portugal deve dar prioridade à recuperação do atraso na qualificação da força de trabalho e sustentam frequentemente que ultrapassar esse atraso deve ser uma prioridade nacional. Mas não dão nenhuma solução sobre como o fazer.
Quando tive responsabilidades políticas convivi com muita gente capaz desta compartimentação entre a preservação da "sua" escola e a necessidade de encontrar uma solução que resolva o aborrecimento de ser evidente o nosso atraso educativo. Por causa deles, só muito a custo se conseguiu começar o processo com o nome hermético de "reconhecimento, validação e certificação de competências", mesmo assim com muitas cautelas e só até ao 9º ano, não fosse a abertura contaminar a base de recrutamento do escol intelectual da nação ou perturbar o sacrossanto processo de ingresso no ensino superior.
O governo que resultou das eleições de 2005 percebeu que era necessário passar das palavras aos actos, tornou o hermético e raquítico RVCC em parte da iniciativa com o apelativo título de Novas Oportunidades, foi à concertação social discutir o assunto com os parceiros, definiu metas ambiciosas para 2006-2013 e previu financiamento para atingir essas metas; fez ainda uma grande campanha publicitária, apelando a que os portugueses usassem esta oportunidade. Foi correspondido. Ao que parece mais de um milhão de pessoas procurou as ditas Novas Oportunidades, mais do que eu esperaria ser possível. Os portugueses demonstraram que percebiam o que os neoelitistas não percebem. Como se apurou, percebiam que só quem tem o 12º ano tem, neste mundo "a escola completa".
O crescimento na procura de educação deveria deixar felizes os nossos professores e formadores, com trabalho redobrado e o compensador sucesso de recuperar educativamente gerações perdidas. Contudo, não terá sido por acaso que Pedro Passos Coelho escolheu uma plateia de professores para lançar a sua diatribe mal-informada e/ou mal-intencionada contra as Novas Oportunidades. Não custa a acreditar que tenha sido aplaudido. Ainda custa menos a acreditar que entre quem aplaudiu houvesse espíritos que juntaram à compartimentação acima referida uma outra. A de quem diz que Novas Oportunidades sim, mas sem "as perversões, a futilidade e o risco" das actuais. A retórica reaccionária sempre brandiu essas três teclas perante qualquer reforma.
Independentemente da posição que se tenha sobre esta iniciativa, convém que tenhamos noção da extensão do problema. O atraso educativo português pode expressar-se num número singelo: se Portugal progredisse na percentagem da população activa que tem o 12º ano à média a que progrediu entre 2000 e 2005 levaria mais de um século a atingir a média europeia. Desde o lançamento das Novas Oportunidades, pelo efeito combinado de todas as medidas, reduziu-se esse lapso de tempo para menos de meio século.
Passos Coelho desconfia que estejamos a ir depressa demais. Anuncia uma "auditoria externa" à iniciativa. Bem vistas as coisas, foi dizer aos profissionais de educação que desconfia que eles estão a cometer uma fraude. Será? O profissionalismo de docentes e formadores é a melhor garantia possível de que assim não será. Mas venham todas as auditorias que se julgue necessárias. É melhor que haja medidas para auditar em vez de um vazio sobre o qual todos carpimos ruidosamente.
Foram os jornais que o censuraram ou, para além de brandir com a ameaçadora "auditoria" não fez nenhuma proposta concreta de melhoria da iniciativa? Dêem-lhe uma nova oportunidade para dizer o que pensa. perguntem-lhe se acha bom para o país que a nossa população activa demore um século a chegar ao nível europeu de conclusão do 12º ano. Se ele disser que sim e o povo concordar, feche-se as Novas Oportunidades e cruze-se os braços. Os nossos concorrentes agradecem.


(clique sobre a figura para ampliar)

1 comentário:

António Carlos disse...

"Desde o lançamento das Novas Oportunidades, pelo efeito combinado de todas as medidas, reduziu-se esse lapso de tempo para menos de meio século."
Não seria mais rápido, encurtando ainda mais esse lapso de tempo, tornar esse processo meramente administrativo dizendo, por exemplo, que tem tivesse mais de 10 anos de vida activa estava automaticamente habilitado como o 12º ano? Assim pelo menos não se fazia de conta que havia formação e avaliação e poupava-se muito em acetatos, formadores, ...
Não se aprendeu nada com os erros do Fundo Social Europeu. Ou melhor, aprendeu-se muito ...