23.5.11

Descer muito a TSU para subir muito o IVA. O PSD ou é ingenuamente aventureiro ou perversamente liberal.

 A pretexto do reequilíbrio fiscal definido no memorando da troika, ressurgiu em Portugal o debate antigo da redução da taxa social única e do aumento concomitante do IVA, mas talvez não saiba que à partida para esse debate temos a 16ª TSU e a 5ª taxa de IVA mais altas da Europa.
O argumento a favor da redução da TSU é clássico: reduzindo os custos não salariais da mão-de-obra, diminui-se a carga fiscal sobre as empresas e aumenta-se a sua competitividade. Recorde-se que esta redução terá impacto diferencial. Apenas aquelas em que os custos com mão-de-obra são uma parte importante da factura fiscal beneficiariam com a medida. Essas, tenha-se presente, são as menos produtivas, as antigamente conhecidas por intensivas em mão-de-obra, que pagam baixos salários e obtêm baixas produtividades.
O argumento contra a redução da TSU também é conhecido: diminuindo-se as contribuições sem compensação pôe-se em causa a sustentabilidade da segurança social; com compensação, transfere-se a carga fiscal da TSU (que incide em mais de 2/3 sobre a empresa) das empresas para os cidadãos, seja penalizando as classes médias (o caminho seguido até agora de aumento do IVA), seja penalizando transversalmente as classes sociais (caminho não trilhado de aumento do IRS).
O debate tem produzido um equilíbrio razóavel em Portugal. Conteve-se o aumento da TSU, tomou-se as medidas necessárias para manter o roçamento da segurança social equilibrado, quando necessário transferiu-se uma parte do financiamento para o IVA, que apesar de limitada, provocou aumento da taxa a cobrar..
Agora o PSD pretende desfazer esse equilíbrio com a arrojada proposta de descer 4% a TSU. Entenda-se que descer 4% uma taxa que incide sobre 34,75% das remunerações não é descer em 4% as receitas dessa taxa, mas em 4/34,75 ou seja, em 11,5%.
Onde poderá compensar-se essa descida? Surgem duas alternativas: descapitalizar a segurança social ou subir outro imposto. A primeira levaria a um défice imediato da segurança social, que é tudo o que o país não precisa agora. A segunda implica ponderar para onde se faz essa transferência. Poderia ser feita dentro dos impostos sobre as empresas, aumentando o IRC, que já é o 9º da UE e penaliza essencialmente as empresas competitivas e exportadoras (as que verdadeiramente pagam impostos); ou para os impostos sobre as pessoas, aumentando o IRS ou o IVA.
O aumento de IRS não está em cima da mesa, que eu saiba. Chegados a este ponto, surge a opção entre TSU, IRC e IVA. É aí que os portugueses têm razões para ficar surpreendidos com a suposta ousadia: a TSU que se pretende descer é a 16ª da União Europeia, enquanto a taxa de IRC é a 9ª e a taxa máxima de IVA é a 5ª.
Mas se o reequilíbrio fiscal negociado com a troika levar a um aumento de 2% do IVA, já seremos a par da Suécia o país com mais elevada taxa. Como não é credível que o reequilíbrio fiscal se reduza a esta matéria, então o que o PSD está a propôr é que Portugal passe a ser de longe o país com a mais elevada taxa de IVA da Europa, penalizando ainda mais as classes médias e também os mais pobres. A esta ousadia chamaria eu outra coisa. 
Há a hipótese perversa de que pretendam fazer ruir a segurança social ou a hipótese admissível de que aceitem, como disse hoje José Sócrates, transferir impostos das empresas para todos os cidadãos. Na primeira hipótese estariamos perante neoliberalismo selvagem. Na segunda perante um tiro aventureiro e clientelar na ânsia de protecção aos interesses do tecido empresarial menos evoluído do país, o velho pequeno patronato, tradicional base de apoio do PSD, que reivindica esta "revolução" há muito tempo. Em qualquer dos casos, de tudo o que se viu até agora, esta é a medida que melhor define o programa do PSD: ou é ingenuamente aventureiro ou perversamente liberal ou acumula.

1 comentário:

beijokense disse...

Caro Paulo Pedroso,
não precisa de tão longo exercício sobre as suposições. Nos docs (do chamado acordo com a troika) que o seu partido (ou alguém por ele) assinou, está lá tudo (só faltam os valores:

1. que a mudança do sistema fiscal é neutra em termos orçamentais, i.e. a diminuição da receita da TSU é compensada pelo aumento de outras receitas e por eventuais cortes adicionais de despesa;

2. que a receita preferida para a compensação é o IVA, nomeadamente pela passagem de alguns bens e serviços das taxas reduzidas e intermédias para a taxa mais elevada;

3. que a descida da TSU é compensada pela alocação de receitas equivalentes de modo a não colocar em risco a sustentabilidade do sistema de pensões;

4. que haverá medidas para mitigar o impacto social da subida do IVA.