27.6.12

Congresso Democrático das Alternativas: defender a República para o século XXI

Ao contrário do meu amigo Daniel Oliveira, limitei-me a juntar-me - e em cima da hora - à primeira vaga da onda do Congresso Democrático das Alternativas, cujo manifesto já está disponível no Arrastão.
texto da convocatória, desculpem-me os seus autores, não me entusiasmou e não o acho particularmente inspirado ou construído de forma a potenciar a máxima convergência possível. Há alternativas para além da denúncia que se presume unilateral do memorando de entendimento com a troika.
Mas sem discutir alternativas não se consegue sair dos simplismos dicotómicos e acredito que a necessidade da discussão está tanto ou mais no espírito da convocatória quanto a sua linguagem, excessivamente Syryza para o meu palato político.Quem quiser discutir o mundo em transformação não pode prender-se excessivamente ao ponto de partida de quem generosamente se prontifica a abrir a discussão. Pessoalmente, interessa-me menos saber qual é o ponto de convergência dos diligentes iniciadores do Congresso do que o conteúdo do debate que com o seu trabalho tornam possível.
Num ponto não tenho dúvidas em acompanhar o espírito do Manifesto que hoje é apresentado - tem que haver outras saídas para a crise. As postas em prática na Europa desde a derrota de Gordon Brown no Reino Unido não funcionam e empobrecem-nos colectivamente.
Também não gosto do Memorando de Entendimento e preferia que ele nunca tivesse existido, mas sem esquecer as responsabilidades partilhadas por toda a esquerda portuguesa, do PS ao PCP e ao BE, na criação da crise política que o tornou inevitável.
Acresce que a crise mudou desde o tempo em que o Memorando foi assinado. Não é  uma crise localizada num pequeno grupo de países com problemas orçamentais e de despesa pública, mas uma crise de ausência de respostas europeias e de mecanismos que sustentem a sua moeda. Também não é uma crise devida às maldades da existência do Euro, mas aos erros institucionais com que nasceu.
Em Portugal a intensidade da crise económica e social foi agravada, não é demais repeti-lo, pelo derrube do governo minoritário do PS, em que BE e PCP caminharam de braço dado com a direita, porventura inconscientes das consequências do seu gesto. Ninguém à esquerda pode passar por cima deste "incidente", a meu ver trágico, da percepção do que o tornou possível e de como se formou e evoluiu nesse caminho, se pretende sair da retórica das acusações recíprocas para  a busca real de alternativas. Com a esquerda bloqueada e fracturada entre pragmatismo excessivo e maximalismo inconsequente não haverá alternativa nenhuma à solidez política dos governos de direita. Ou talvez haja uma, o bloco central que ninguém quer.
Noutro ponto essencial comungo do espírito e da letra do Manifesto - é necessário um resgate democrático de Portugal. Teremos, concerteza, divergências significativas sobre o conteúdo de tal resgate. Mas, uma coisa é certa, sem resolver os impasses da esquerda ele não acontecerá. E àqueles que pensem que o caminho é o do "milagre" grego recordo que com o PASOK encostado à direita e enfraquecido, o Syryza apenas conseguiu comandar a oposição. Para mim, é fraco consolo para uma esquerda progressista e transformadora assistir impotente à sua fragmentação e dispersão de campos. 
O caminho para que  procuro contribuir é o oposto do grego, é o da geração de alternativas que alimentem plataformas de pensamento que possam corporizar um governo diferente. É por acreditar que haja no Congresso mais gente com quem partilhe essa motivação, ainda que divirja em muitas coisas concretas, que  lá estarei no cinco de Outubro da República cuja comemoração este governo considerou um luxo dispensável. 
Na minha visão, o que importa é defender a República para o século XXI. Quaisquer outras agendas para a iniciativa são legítimas, não sendo as que me movem. Aliás, quem pensou a iniciativa tem toda a legitimidade para puxar por elas.. Eu apenas não acho que partilhá-las seja um pré-requisito para procurar as convergências que mais cedo ou mais tarde desbloqueiem a esquerda portuguesa e façam das actuais esquerdas uma força de governo com importância política proporcional aos eleitores que nela confiam. 
Quem for por outro caminho, acho eu, terá bons soundbytes - que nos promotores há muita gente inteligente capaz de os inventar e dizer - e proclamações gloriosas, mas pouco impacto na transformação progressista do país. 
Cumprimento, antes de mais, a coragem de abrir as portas ao debate entre as esquerdas que os iniciadores tiveram e aproveito também para dizer aos que se fecharem nas muralhas das suas certezas que cometem o erro de pensar que o futuro da esquerda em Portugal se pode fazer pelas linhas do século XX. Tudo aponta noutro sentido.

2 comentários:

Unknown disse...

revejo-me na integra do teu texto. Muito bem.

fernandoccpinto disse...

Passei pelo seu Blog e fui supreendido por uma "pérola factual" dos acontecimentos.
Que eu saiba, o Governo do PS de José Socrates não caiu de nenhuma iniciativa "Moção de Censura" - por muita pena minha - mas sim por demissão e fuga para Paris.
Recordo que já é o 3º Primeiro-Ministro que acontece tal situação, fugir para fora do País e deixar o povo português ainda pior do que antes.