20.4.13

O senhor diálogo social deixa a liderança da UGT

A liderança de João Proença foi marcante ao ponto de se confundir o líder e a central e não ser fácil saber onde começava e acabava a pressão de qual sobre qual.
A recente greve geral em que o sindicalista João Proença fez greve porque o seu sindicato a convocou, assim como a maioria dos sindicatos filiados na UGT, apesar de o Secretário-Geral João Proença se demarcar dela com palavras duras talvez tenha demonstrado que a fusão entre o homem e a organização tinha atingido limites paradoxais, mas." também simboliza a dificuldade das tarefas do sucessor.
Goste-se ou não do estilo, João Prornca foi o senhor diálogo social em Portugal nas últimas décadas. Nenhum acordo se fez sem a UGT, nenhum governo -excepto o actual - ousou governar sem ela ou contra as suas posições.
Contudo, quando João Proença assumiu a liderança não era o único a ambicioná-lá e tudo apontava para a insustentabilidade da subsistência da UGT como actor relevante. Tinha a sua imagem externa comprometida por suspeitas de fraudes com fundos, estava financeiramente estrangulada por dívidas, uma parte significativa dos seus dirigentes históricos tinham abandonado a actividade sindical . O próprio João Proença viu-se politicamente forçado, nas eleições de 1995 a desistir da histórica candidatura a deputado pelo PS.
Proença porfiou, terá cooptado e excluído, o "animal feroz", férreo, intrépido e implacável que surge por trás do ar simpático, fatigado e algo negligé fez vítimas pelo caminho. Mas João Proença foi sempre coerente na estratégia de defesa dos trabalhadores em que acredita, baseada em diálogo e influência. E foi sempre leal ao valor do diálogo. Pessoalmente, recordarei sempre que salvou um acordo comigo na concertaçao com um telefonema no último minuto.
A UGT é filha, como dizem alguns, da guerra fria ou, pelo menos, da reacção necessária - acho eu - à hegemonia radicalizada no PREC do PCP sobre a CGTP. A UGT é a única instituição portuguesa que subsiste em regime de Bloco Central. A UGT tem enormes fragilidades no sector industrial. Mas João Proença fez dela uma voz que continuou a contar contra todas as tentativas de a destruir, para alegria de alguns, incómodo de outros e frustração de outros ainda.
O seu sucessor, para se afirmar, provavelmente não pode tentar ser seu herdeiro. Mas vai actuar num quadro radicalmente distinto de João Proença. Perante um PCP sem Cunhal e uma CGTP sem Carvalho da Silva; com uma separação de águas crescente entre PS e PSD; com um centrodireita indiferente ao diálogo social e um PS sem agenda político-sindical, terá que construir um novo quadro de influência.
Se não tiver face ao antecessor a mesma liberdade criativa que João Proença teve em relação a Torres Couto, provavelmente não triunfará. Veremos.
Este fim de semana o único dado seguro é o de que o senhor diálogo social abandona o terreno da concertaçao. Mas muito me surpreendia se não o fossemos ver por aí. João Proença não me parece ter feitio para ir para casa escrever livros ou para a televisão fazer de senador da República. A política vai receber um quadro, de peso e de valor.

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