17.5.08

O natalismo como política oficial

O Governo tem tomado medidas que visam aumentar a natalidade. Independentemente dos méritos de cada uma delas, é uma resposta adequada à conjuntura. Defendo que o Estado não deve ter política natalista. Deve respeitar a diversidade de escolhas e a liberdade individual. Cabe-lhe apenas apoiar os cidadãos para que não ocorra, de facto, uma política anti-natalista por omissão, isto é, para que as circunstâncias não forcem à renunciar à paternidade e à maternidade, por impossibilidade material - falta de assistência médica, escassez de rendimentos, inexistência de serviços acessíveis e a preços comportáveis. Neste sentido, o investimento em serviços públicos e o aumento do montante das prestações familiares são medidas adequadas e positivas. Tão importantes como seria o encorajamento a que os horários de trabalho se não estendessem recorrentemente para horas anti-sociais ou os aperfeiçoamentos na protecção na paternidade e na maternidade que reduzam a décalage de tempo fora do trabalho entre mulheres e homens, porque esta última, parecendo positiva, resulta em maior discriminação das mulheres no mercado de trabalho. O que é manifestamente excessivo é erigir o natalismo em política oficial. Tal como seria o seu contrário. Deparando-me com o conteúdo do Artº 27º da Lei de Bases da Segurança Social (ver infra), sinto que já se foi longe de mais nesse caminho. Por este andar, na próxima revisão constitucional, alguém se baterá por um artigo que institua o natalismo como política do Estado. Artigo 27.º Promoção da natalidade 1 - A lei deve estabelecer condições especiais de promoção da natalidade que favoreçam a conciliação entre a vida pessoal, profissional e familiar e atendam, em especial, aos tempos de assistência a filhos menores. 2 - As condições a que se refere o número anterior podem consistir, designadamente, no desenvolvimento de equipamentos sociais de apoio na primeira infância, em mecanismos especiais de apoio à maternidade e à paternidade e na diferenciação e modulação das prestações. Querendo, leia a lei na íntegra. Em geral é bastante boa e revoga a contra-reforma da segurança social ensaiada por Bagão Félix.,

2 comentários:

Anónimo disse...

Estou de acordo em que as políticas de apoio e defesa da maternidade acabam por penalizar as mulheres no mercado de trabalho. Talvez o apoio deva ser no sentido de incentivar partilha de tarefas parentais, dando efectivas condições para que isso aconteça.

Pedro Sá disse...

Paulo, concordo em absoluto com o que dizes.

Mas já deves ter ouvido tanto como eu camaradas nossos a debitarem a ladainha que a natalidade tem que ser promovida porque "depois quem vai pagar a segurança social" (e aqui está implícito o medo da necessidade de emigrantes - o que definitivamente não é uma atitude de esquerda).

Por outro lado, a coisa tristemente caminha para uma lógica de que ter filhos é algo que merece absoluto elogio e que é um direito acima dos outros. O que obviamente é um disparate.