25.3.10

O RSI está descontrolado? Até eu tive dúvidas.

Confesso que ao ouvir pessoas de cujas boas intenções não desconfio explicar a necessidade absoluta de conter a despesa com o RSI - cujo custo afinal é de 500 milhões de euros no oceano de uma despesa com segurança social de 20 mil milhões - eu próprio tive dúvidas quanto ao risco de haver algum descontrolo na evolução da medida.
Para as desfazer fui ver as contas do que o país gastou com RMG e RSI, ano a ano, desde 1997 e para ter um termo de comparação sobre se o crescimento da despesa estaria controlado ou não, fui comparar a variação dessa despesa com a da taxa de desemprego, que tomei como indicador de vulnerabilidade social da população em idade activa e da consequente necessidade social da prestação.
Sabendo-se que 2008 é o ano pré-crise e para tornar a leitura dos dados mais fácil, comparei as variáveis a partir de um índice cujo valor 100 é para ambas o ano de 2008.
A minha hipótese é simples: se o RSI tiver uma despesa não relacionada com a intensidade da vulnerabilidade social da população em idade activa, então a despesa será alta mesmo quando a taxa de desemprego for baixa; se tiver alguma relação, então subirá ou descerá acompanhando a taxa de desemprego.

O gráfico está aqui e cada um tirará as suas conclusões. As minhas foram as seguintes: primeiro, o RSI teve o típico crescimento de uma prestação que acabara de surgir; de 2002 a 2004 foi "congelado" pela paralisação administrativa dos serviços que Bagão Félix impôs, demorando eternidades a atribuir prestações e combatendo na secretaria do ministério a prestação que não derrotara no Tribunal Constitucional; de 2005 a 2009, com o regresso de um governo socialista, a tendência voltou a ser normal e o crescimento com a despesa esteve em linha com o crescimento do desemprego.
Em 2010, o novo governo quis mudar de rumo. No Orçamento de Estado previu uma descida da despesa apesar de continuar a prever o aumento da taxa de desemprego. E no PEC decidiu cortar o RSI, independentemente da evolução do indicador sobre desemprego.
Ou seja, o Governo vai cortar na despesa com o RSI, porque assim decidiu na sua escala de prioridades para o ajustamento orçamental .
Como eu desconfiava, mas chegara a duvidar, não há nenhum problema novo com o RSI, o governo é que acha que tem outros problemas que merecem mais atenção. Há escolhas políticas feitas por quem tem legitimidade para as fazer, embora os ventos que impulsionam tais escolhas costumem soprar de outros quadrantes.
Fiquei mais triste mas menos preocupado e completado o exercício senti vontade de dizer aos milhares de técnicos e voluntários do sector social que mantêm esta prestação a funcionar há uma dúzia de anos que eles fizeram o mais difícil e em que poucos acreditavam: demonstraram que o RSI é gerível em Portugal.  Este corte nada tem que ver com eles nem com o comportamento dos beneficiários.
Apenas aconteceu que a luta contra a pobreza extrema perdeu conjunturalmente prioridade entre as prioridades de quem governa, apesar de estarmos no Ano Europeu de Luta contra a Pobreza e a Exclusão Social.
Era possível cortar os 130 milhões de euros noutras despesas que não nestas e nesta altura? Era, mas não seria, de facto, a mesma coisa.

2 comentários:

Sérgio Aires disse...

Caro Paulo, EXCELENTE! Uma análise útil (para quem tivesse dúvidas) e que merece ser disseminada o mais possível. E já agoral, uma outra pergunta: o que é feito da Estratégia Europeia de Inclusão Activa (que permitiria aperfeiçoar ainda mais esta medida)? Começo a achar que 2010 ficará marcado - paradoxalmente - por ter sido o pior ano de sempre para o combate à pobreza e exclusão social...

Maria Santos disse...

Dr. Paulo: Muito lhe agradeço ter-me ajudado na minha tese de licenciatura, cujo tema era sobre a "inserção socio-profissional dos beneficiários do RMG", nos tempos idos dos projectos-piloto, no ano lectivo 1996/97. A si, ao dr Edmundo Martinho e ao Dr Francisco Branco.
Graças a essa medida de politica social consegui integrar o mercado de trabalho...Porque sou Assistente Social.
Volvidos quase 13 anos de trabalho, sinto que a verdadeira filosofia do RMG (agora RSI) nunca foi tida em conta. As "medidas de alfaiate" sempre foram "pronto a vestir"; os beneficiários reconhecem os seus direitos e raramente cumprem os seus deveres... não estou a ser péssimista nem negativista... mas é o que me encaro no dia a dia!
Acompanhamento não o consigo fazer, porque aos técnicos é pedido "contas e estatisticas" que certas cabeças pensantes que estão "refastelados" nos gabinetes inventam, tal "big brother", para nos controlar; a fiscalização coloca em causa o nosso trabalho e ainda nos dá mais; somos cada vez menos a fazer cada vez mais...
Com isto, as familias vão tendo a "esperteza" de nos esmiufrar até ao tutano, dançando ao sabor dos tempos, em que nós técnicos mal conseguimos ter tempo para planear...
É impossivel 1 técnico acompanhar 200 familias em concelhos cujas distancias são enormes, sem transporte, em que não há respostas institucionais e as que saiem são as tais "medidas de pronto-a-vestir", em que só falamos com as pessoas de ano a ano SE as convocarmos, em que... etc, etc, etc...
Não me sinto Assistente Social. Sinto-me bombeira e às vezes, muitas mesmo, um verdadeiro "pau mandado" ou um "saco de porrada", dos pequenos e dos grandes...
Nunca deixei de acreditar na filosofia desta medida.
Nunca deixarei de gostar do que faço...
Mas por favor, dêe-nos pessoal capacitado para acompanhar e ensinar as familias a prescindirem deste direito...
Afinal, é como diz o Dr Edmundo Martinho, de quem gosto imenso, "os beneficiários tem o direito de sair da prestação"...

Isto... foi apenas um desabafo!