8.9.12

A educação de um povo/leituras: A Ana e a Mariana (sem esquecer a clássica Maria)


O LMC foi ver o que une e divide a Ana, a Mariana e a Maria.


Faltavam poucos minutos para as oito e meia da manhã desta quarta-feira 5 de Setembro. Saio do autocarro 728 e dirijo-me ao quiosque no Cais do Sodré em frente da entrada do Metro para comprar o Público. Ao meu lado, uma senhora de meia idade dirige-se ao casal de vendedores e pergunta se têm a ANA. Já não temos, responderam, só temos a MARIANA. A potencial compradora afastou-se, nem água vai nem água vem, como se tivesse sido vítima de uma heresia. REvista só há uma, a ANA e mais nenhuma!
Fiquei de orelha guiada e num quiosque para os lados do Campo Pequeno comprei a ANA, a MARIANA e, já agora, a clássica e histórica MARIA. Por junto 1,95€ porque o preço é uniforme: 0,65€. De imediato mergulhei no universo das revistas de bolso dirigidas sobretudo às mulheres. De resto, a ANA reivindica-se de mulher para mulher e a MARIA, mais do que uma revista a sua maior amiga. Não vislumbrei especial referência na MARIANA embora ostente na capa o símbolo 100% portuguesa. Remoque?


Alguns traços em comum:

1. Longevidade

Num panorama editorial caracterizado pelo aparecimento (muitas vezes efémero) e desaparecimento de publicações, as 3 revistas revelam capacidade resistente e exibem tiragens generosas.
A MARIA já vai no nº 1765 e reclama uma tiragem média de 242 750 exemplares por edição. Contas de merceeiro, na média de 50 edições ano, a MARIA já se publica há mais de 35 anos e em cada ano venderá mais de 10 milhões de exemplares!
A ANA vai no nº 797, indica tiragem média de 58 500 exemplares por edição. Pelas mesmas contas, já sobrevive há cerca de 16 anos.
A MARIANA é mais recente, vai no nº 489, indica uma tiragem média de 50 000 exemplares, devendo andar perto de celebrar 10 anos de vida se, em qualquer dos casos, nenhuma das publicações sofreu interrupção editorial.

2. O seu a seu dono

A MARIA e a ANA pertencem ao universo IMPALA/Jacques Rodrigues. A MARIANA pertence à PRESSPEOPLE, grupo que tem uma linha editorial centrada na culinária com particular enfoque na saudável e vegetariana, para além de uma linha de publicações em torno dos astros, salmos e orações poderosas.
Para quem como eu tem um pós-doc em vida social, tirado na prestigiosa universidade de Marbella, dei conta agora que o grupo IMPALA tem 4 publicações, dirigidas (particularmente) a mulheres das classes D (MARIA), C (ANA), B (NOVA GENTE) e A (VIP). Curiosamente o tamanho é também crescente sendo a MARIA a minorca e a VIP a que tem uma superfície mais ampla.
A MARIANA, suponho que corresponde a um trocadilho ou provocação no ataque ao domínio IMPALA (MARIA¨+ANA), tem um tamanho intermédio, maior que a MARIA, mais pequena que a ANA.

3. Temáticas

Vai tudo bater no mesmo. As 3 revistas dedicam o essencial da primeira página à telenovela da SIC, Dancing Days, que está a contribuir para que a televisão do Balsemão esteja a bater a TVI na prime time. As revistas cavalgam a onda do fenómeno ou inserem-se numa estratégia mais global, companheiras úteis, da ofensiva do canal de Carnaxide?
As telenovelas, os últimos acontecimentos acontecidos e vindouros dos próximos episódios consomem a parte de leão de todas elas.

MARIANA: Duarte rejeita Júlia
MARIA: Mariana conhece o pai e descobre que tem um irmão... mas é rejeitada
ANA: Traição entre irmãs/Raquel rouba namorado a Júlia

Três manchetes todas relativas a Dancing Days.

Sexo: muito e diversificado, com chamadas na primeira página:
ANA: Sexo/Descubra se está a ser traída
MARIA: Teste/Fantasias sexuais por revelar?

Talvez porque anda a vender a colecção CRUZES DO MUNDO (2 colares com +2,95€), a MARIANA é mais parca, chamando à primeira página as declarações da actriz Ana Guiomar que garante não gosto de me ver com implantes.
Para lá das traições, a ANA dedica 2 páginas a 22 lições sobre jogos libidinosos em que é proibido usar mãos e a MARIA desenvolve os 6 mitos comuns sobre os homens. 
A MARIA tem ainda um correio íntimo para ela (tenho vergonha do que ele me pede) e para ele (como fazê-la adorar sexo?) e a ANA publica um conto erótico.
Culinária, receitas, cuidados de beleza, roupas, regresso à escola/filhos, horóscopo, fofoquices de "famosos" nacionais e lá de fora, cenas insólitas (MARIANA: noiva cai ao rio durante as fotos do casamento) são questões transversais nos conteúdos de todas.

4. Publicidade

A contracapa das 3 revistas é de empresas de crédito rápido. As duas da IMPALA, Cofidis. A MARIANA, Cetelem, mas o verso da primeira página é da Cofidis e a Cetelem tem uma página impar na Maria.
Cremes, tratamentos, plataformas vibratórias, soluções para a calvície, astrólogos e videntes, turismo alimentam publicitariamente as 3 revistas.


Eis sinteticamente a minha peregrinação por 3 publicações do nosso panorama editorial que fabricam 20 milhões de cópias por ano correspondendo a 6 mil milhões de páginas impressas, se dermos como bons os números apresentados nas tiragens.
Já parecem os números do deficit, mas, pelas aparências, a crise não está a passar (muito) por aqui...

Boas leituras.

LMC 

1 comentário:

Maria Santos disse...

Qualquer uma delas, das revistas, inclusivé do grupo da Maria e da Ana... são daquele tipo de revistas (para mim!!!)que servem apenas para ler as "gordas" quando se está na sala de espera para uma consulta médica!
Sorte a minha que raramente vou ao médico!
Adorei o post, fartei-me de rir e concordei com tudo!
Como eu costumo dizer "tudo esprimido não dá nada!"... Mas garanto que já assisti a discussões ferverosas sobre os assuntos dessas 3 revistas!
Pronto, sempre há quem as lê!!!