O efeito pretendido está conseguido. A Administração da Parque Escolar
demitiu-se. A nuvem da suspeita instalou-se. A notícia deixou de ser a
quantidade e a qualidade sem paralelo de obra pública de renovação de
parque escolar público executada num contexto de combate aos então
riscos de recessão. A frio, os académicos e os historiadores dirão que os relatórios nunca disseram o que se disse que diziam.
Mas os comentários e as manchetes dos que foram enganados, quiseram
enganar ou ambas as coisas continuarão até ao infinito à procura de
sinais que se possam torcer o suficiente para corroborar o que foi
insinuado. Há-de haver muitas investigações para invocar. Triunfará a
máxima do fumo e do fogo.
No fim, contudo, as escolas terão sido renovadas. Quem as conhece,
sabe-o. É o lado bom. Mas os que deram a sua energia para que esta
medida importante ocorresse serão enxovalhados, diminuidos nas suas
carreiras profissionais, perguntar-se-ão trinta vezes porque se deixaram
"meter nisto" da causa pública.
Eu próprio tenho que resistir à tentação de moderar o elogio à obra da
Parque Escolar com um "hão-de ter cometido erros, concerteza". Quem
lança estas campanhas sabe que geram esse tipo de defesa recuada, que
amolecem os espíritos.
A sanha sobre a Parque Escolar é uma forma eficaz de desinvestir na
continuação da renovação das escolas. Agora será tempo de parar para
refazer, repensar. Crato
nomeará um grupo de trabalho que tornará quase impossível adjudicar uma
obra escolar na próxima década. E as escolas que se degradavam e não
foram intervencionadas a tempo ficarão à espera do fim da crise e de um
governo mais amigo da escola pública.
É uma forma subtil de nos desviar da discussão sobre o desinvestimento
em geral na educação. O que fica depois de toda esta polémica, nas Novas
Oportunidades e na Parque Escolar, é a ideia do dinheiro mal investido.
Que excelente desculpa para aprofundar os cortes orçamentais e usar,
sempre que os argumentos faltarem, em má retórica parlamentar.
É uma forma brutal de destruir a credibilidade das reformas em prol da
escola pública dos dois últimos governos do PS. Aliás, as duas ministras
de Sócrates terão muita sorte se não acabarem no calvário de Leonor
Beleza (e outros). A história portuguesa diz que, seja de que partido
for, político que se destaque por agitar as águas contra os interesses
realmente instalados não acaba longe nem bem. Curiosamente, político que
as navegue sem ondas nas águas estagnadas dos ditos interesses, parece
tender a acabar moralista de serviço e pregador de virtudes públicas num palco perto de si.
A nova direcção do PS mover-se-à em defesa do património político e de
credibilidade do Governo anterior nesta matéria à velocidade, com a
intensidade e com a convicção com que se move em todos os assuntos em
que este seja posto em causa. Ao fazê-lo não percebe que
perde inclusive margem de manobra para a auto-crítica partidária. Se sou
passivo em relação a todos os erros de que acusam o anterior governo
como posso distinguir na revisão da agenda política do partido aquilo de
que me pretendo distanciar das bandeiras que pretendo continuar a
erguer? A ambição de refundar ofusca e deixa o terreno livre para que
estas operações fiquem sem a réplica adequada.
Gostava que Portugal fosse um país em que quem faz o que Crato fez neste caso acabasse como o Porfírio sugere que acabe. Mas o que verdadeiramente me preocupa é ter a ideia de que o Crato de cada ocasião acaba a herói e não a vilão.
1 comentário:
Aplausos!
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